O golpe permanente
Por Adriano Benayon
Tenho assinalado que os processos de
desnacionalização da economia, de desindustrialização e de
desestruturação do Brasil foram desencadeados desde o golpe de Estado
de agosto de 1954.
2. A corrupção na política e em
instituições públicas e privadas, que viabilizou esse golpe, tornou-se
uma constante ao longo de nossa história, desde então, ficando o País
destituído de verdadeira autonomia.
3. Refiro-me à corrupção proveniente de
fontes estrangeiras, no interesse do sistema financeiro e dos carteis
transnacionais, mais que à gerada internamente, da qual se faz grande
alarde, como instrumento de mais intervenções contrárias aos interesses
nacionais.
4. Em todas as intervenções políticas
sofridas pelo País, desde 1954, tem estado subjacente, a ameaça de
intervenção armada estrangeira, muitas vezes velada, salvo no próprio
golpe de 1954 e no de março de 1964.
5. Ela faz parte do leque de
instrumentos intervencionistas, em que tem sobressaído, cada vez mais, a
corrupção sistêmica, por parte de fontes estrangeiras, valendo-se,
pois, da Quinta Coluna, ampliada e desenvolvida dentro do País ao longo
dos últimos 62 anos.
6. A desnacionalização da economia, a
desindustrialização e a desestruturação - resultantes do modelo
econômico implantado - produziram, entre outros efeitos perversos,
minar as finanças do País, formando dívidas públicas imensas.
7. A seguir, transformaram essas dívidas
em fonte adicional de empobrecimento, mediante a decretação de juros,
correção monetária e outras taxas exorbitantes, cuja capitalização as
fez crescer exponencialmente.
8. De fato, a dívida pública interna
teve seu saldo multiplicado mais de 25 vezes, somente após a edição do
Plano Real (1994), cujos mentores fraudulentamente o proclamaram como
estabilizador da economia e da moeda, e eliminador da correção
monetária.
9. A dimensão dessa mentira criminosa
pode ser avaliada, compulsando a taxa SELIC acumulada no ano seguinte ao
Plano Real (1995): 53% aa. Em 1994, já ultrapassara 12%.
10. Isso ilustra a cumulatividade do
processo do processo de subdesenvolvimento, já que o enfraquecimento
financeiro decorrente do serviço da dívida pública se soma ao
proveniente das demais mazelas geradas pelo modelo econômico: déficits
externos colossais advindos da desnacionalização da economia,
superfaturamento escandaloso dos bens vendidos no Brasil pelas empresas e
carteis transnacionais, inclusive os das ex-estatais privatizadas,
infraestrutura inadequada e geradora de custos altos.
11. Tem feito parte dessa cascata de
consequências deletérias do modelo implantado desde 1954, debilitar as
Forças Armadas, abaixar a qualidade cultural, o grau de identificação
das pessoas com a Nação, o nível da educação em todos os graus, e causar
o êxodo, por falta de oportunidades de trabalho, de residentes
qualificados.
12. Tudo isso concorre para explicar por
que, em todos os governos, tenham, no cômputo geral, prevalecido os
interesses dos que saqueiam a economia do Brasil sobre os dos
residentes.
13. Explica também por que as potências
imperiais, que lideram esse saqueio, não precisaram recorrer a ameaças
de intervenção armada explícita nas diversas sucessões presidenciais
ocorridas desde 1967.
14. Há que ter presente que essas
potências não costumam abster-se de tal tipo de intervenção, quando o
julgam necessário, mesmo fora do Continente Americano, incluídas as
ilhas e o Mar do Caribe, considerado um lago norte-americano, do ponto
de vista real.
15. Atualmente, desde a participação da
aviação e de mísseis da Rússia para deter a devastação da Síria
(repetindo as do Iraque e Líbia, para citar só as mais recentes), o
quadro do poder mundial pode estar tendo modificação após a situação de
1990 em diante, quando o império anglo-americano se viu de mãos livres
para invadir direta ou indiretamente qualquer nação cuja liderança
estivesse deixando de cumprir integralmente os ditames imperiais.
16. Notável é que, não só na grande
mídia brasileira - que pratica, sem cerimônia, toda desinformação
possível a serviço do império, inclusive distorções semânticas das
palavras – também o grosso da mídia dos países ocidentais e Japão, entre
outros, apoia sistematicamente a deformação das consciências,
ocultando-lhes a realidade dos fatos e inculcando-lhes preconceitos e
ideologias facilitadores da aceitação do governo mundial.
17. Exemplo impressionante disso é a cobertura da intervenção militar por meio de mercenários e terroristas, patrocinada pelos EUA e seus satélites da OTAN e regionais, por parte do jornal francês Le Monde.
18. Esse diário - que foi um dos mais
acatados, mercê da qualidade e independência dos jornalistas,
proprietários dele – foi recebendo participações de capital de grupos
financeiros, até estes passarem a ditar a linha editorial.
19. Assim, o Le Monde refere-se como
“guerra civil”, à brutal intervenção armada estrangeira na Síria -
comandada pelo governo dos EUA, que resolveu proclamar que o presidente
da Síria, Assad, tem de sair, e pronto. E só fala dos mercenários,
terroristas e degoladores do ISIS (Estado Islâmico), como os “rebeldes”,
como se fosse cidadãos locais em conflito com o respectivo governo
DÍVIDA PÚBLICA EXTERNA E INTERNA
I – O que é a dívida?
O povo brasileiro sofre demais, em
função da dívida pública, cujo estoque passou de 4 trilhões de reais (em
dezembro de 2015, R$ 3,94 trilhões) e envolve despesa no orçamento
federal, próxima a 1 trilhão de reais = 42% do total do orçamento.
2. Essa despesa equivale a 1/5 (um
quinto ou 25%) do PIB, muito superior ao total dos investimentos
públicos e privados realizados no País (14% do PIB). Se fosse eliminada,
o Brasil poderia investir na economia e na infraestrutura econômica e
social, percentual de 39% do PIB, maio que o investido pela China no
auge de seu desenvolvimento.
3. Essa dívida formou-se basicamente
pela capitalização dos juros absurdamente altos que o cartel dos bancos
exige do Banco Central para adquirir títulos do Tesouro: taxa SELIC mais
margem, em torno de 3% aa., o que eleva a atual taxa efetiva para mais
de 17% aa.
4. Assim, a dívida interna cresceu 30 vezes, de 1994 para cá. 1994 foi o ano do Plano Real, um conjunto de fraudes, entre as quais a de o “governo” de então proclamar que a moeda estava estabilizada e que dever-se-ia acabar com a correção monetária.
5. Em seguida, em 1995, as taxas SELIC,
decretadas pelo Banco Central desse “governo” acumularam 53%. A dívida
interna de R$ 136 bilhões em dezembro de 1994, chegou agora a R$ 4
trilhões.
6. A dívida externa voltou a subir e
retornou a patamar muito alto (US$ 545,4 bilhões em dezembro de 2015),
devido aos enormes déficits de transações correntes com o exterior, que
acumularam US$ 337,9, de dezembro de 2010 ao final de 2015.
7. Além disso, o saldo dos investimentos diretos estrangeiros, US$ 1 trilhão, mais os investimentos estrangeiros em carteira, cerca de US$ 700 bilhões, elevam o passivo externo bruto a mais de US$ 2,2 trilhões (equivalente a R$ 8 trilhões, o dobro da dívida interna.)
8. A esse passivo externo ainda haveria
que adicionar boa parte da dívida interna, detida por estrangeiros e
brasileiros residentes no exterior. Diante disso, as reservas
brasileiras (US$ 356,35 bilhões) e os investimentos brasileiros no
exterior, cerca de US$ 400 bilhões (difíceis de retornar, em situações
de crise) não significam situação confortável.
II – De onde vem a dívida pública brasileira?
9. Se não identificarmos as causas das dívidas que nos estão sugando, de nada adiantaria acabar com elas, mesmo um milagre as extinguisse. Por que? Porque não se removendo as causas, se estaria formando, em pouco tempo, nova dívida tendente a crescer exponencialmente, como aconteceu com a atual.
10. A dívida externa foi a primeira a
surgir e a gerar crises tremendas no País, agravadas por arrochos
violentos sob a direção do FMI.
11. Houve muitas dessas crises, desde o
ponto de viragem para o subdesenvolvimento, decorrente da deposição do
presidente Vargas, em 1954. A primeira, ao final do mandato de J.
Kubitschek, 1960/61.
12. Essa, como as seguintes recorrentes,
resultou da desnacionalização da economia, com a entrega aos carteis
transnacionais dos mercados industriais do País, desde janeiro de 1955.
Então, foram baixadas as Instruções da SUMOC, que propiciaram subsídios
inacreditáveis, para esses carteis, donos de grandes empresas em grande
número de países se apoderarem de nosso mercado industrial.
13. Esse crime contra o Brasil foi cometido pelo governo egresso do golpe de 1954, por militares pró-EUA e políticos da UDN. São raríssimos os economistas que atribuem importância, a tais modificações na política industrial e de capitais estrangeiros, aplicadas com entusiasmo e ampliadas, por JK, enganosamente tido por desenvolvimentista.
14. Ele adotou o falso conceito da CEPAL
(Comissão para a América Latina das Nações Unidas), segundo o qual o
importante era industrializar-se, sem se importar com quem controla o
capital e a tecnologia das indústrias.
15. Resultado: sob JK e sob os governos
militares, o País teve altas taxas de crescimento do PIB, por algum
tempo, mas crescia errado. Por isso, o Brasil pagou caro demais: décadas
perdidas, desde a dos anos 80. A dívida externa subiu de menos de US$ 1
bilhão em 1954, para US$ 90 bilhões em 1982.
16. Os falsos desenvolvimentistas
jactaram-se da industrialização, mas mentiam, ou ignoravam que o Brasil
se industrializava na primeira metade do Século XX, sem aporte
significativo de investimentos diretos estrangeiros.
17. O modelo de “desenvolvimento
dependente” é uma contradição em termos, uma impossibilidade. Promovendo
e subsidiando os “investimentos” estrangeiros, causou fabulosos
déficits externos, cujo financiamento, juntamente com os empréstimos
públicos para apoiar esses “investimentos”, fez a dívida externa crescer
exponencialmente.
18. A contradição foi defendida por FHC,
no péssimo livro Dependência e Desenvolvimento na América Latina
(coautoria com Enzo Faletto).
19. Por essas e outras provas de ser
inimigo dos interesses nacionais, FHC foi conduzido pelo império
anglo-americano à presidência da República, a fim de aprofundar o
desastre da economia brasileira, com as privatizações, dando
continuidade ao pacotão de leis antinacionais que Collor fez o Congresso
aprovar em menos de dois meses.
20. Diziam promover a industrialização e
garantiram que o País se desindustrializasse, consequência natural da
desnacionalização da economia, em razão de: a) empobrecimento do Brasil
com os arrochos acarretados pelas crises de dívida externa; b)
praticarem os carteis transnacionais preços absurdos (múltiplos de
mais de 3 do real custo de produção) e transferirem os lucros para as
matrizes, através de vários mecanismos; c) concentrarem nas matrizes a
produção dos componentes de maior valor agregado e conteúdo tecnológico.
21. O resultado é a industrialização,
não apenas por ter o produto industrial caído a menos de 10% do PIB, mas
por ser constituído, cada vez mais, por bens intensivos de recursos
naturais e decrescente conteúdo tecnológico.
22. São tendências terríveis e que se
manifestam também em termos do emprego, que decai tanto
quantitativamente como do ponto de vista da qualificação.
* Adriano Benayon é doutor em Economia, pela Universidade de Hamburgo, Alemanha; autor de Globalização versus Desenvolvimento.
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*Via jornal "O TRAMBIQUE" de Otávio Martins Amaral
*link para ler o jornal "O TRAMBIQUE"
https://drive.google.com/file/d/0B9FR93OLJv-UcFNHMm5VRGhPMmtodkVreTFCZ2o2bGZCUHdJ/view
http://sarauxyz.blogspot.com.br/2016/03/o-trambique-as-aguas-de-marco-fechando.html
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