domingo, 22 de novembro de 2015

* coisas fugidias





de tarde, deitada na cama, olhando o reboco 
de massa corrida no teto do quarto
depois de ter cuidado de mil coisas na casa e cansada
ainda assim  as ideias para escrever não a deixavam em paz

pensava nas coisas fugidias e nas coisas irreversíveis
na morte da menina de quase 20 anos, por câncer
no enterro e na dor lancinante dos pais dela

a morte irreversível, a vida irreversível

se está vivo, se está e pronto
não se pode deixar de estar vivo se a morte não chega
não se pode deixar de sofrer pela morte de uma filha
esta dor deve ser a dor menos irreversível que existe 

coisas que fogem da gente e nós fugimos de coisas
eternamente fugirão e eternamente seremos fugitivos?
este tal de eterno retorno...nunca vou entender.

a dor que se sente é coisa fugidia
não se consegue alcançar a dor 
e nunca se pode voltar no tempo

* «O poeta é um fingidor. Finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente.» Fernando Pessoa

o irreversível derruba e foge.


Nadia Gal Stabile - 22 11 2015




*"irmão das coisas fugidias" verso do poema "Motivo" de Cecília Meireles

 


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