http://www.revistaforum.com.br/semanal/paul-singer-nao-defendo-o-impeachment-mas-pela-logica-deveria-passar/
Em conversa com a
Fórum, o economista e sociólogo que ajudou a fundar o PT disse acreditar
que, se o Tribunal de Contas da União rejeitou o recurso do governo e
reprovou suas contas, a lógica é que o processo de impeachment vá para
frente, ainda que não o apoie. Crítico, Singer enxerga uma única saída
para a crise do partido: “Convencer a Dilma a parar com o ajuste fiscal”
Por Ivan Longo
O
economista, sociólogo e ativista da economia solidária Paul Singer
representa hoje uma das últimas figuras que carregam os princípios do
partido que ajudou a fundar em 1980. Militante socialista desde os anos
1950, quando era metalúrgico e foi um dos líderes da Greve dos 300 Mil,
ele está nitidamente decepcionado com os rumos que o PT tomou depois que
virou governo, principalmente a partir do segundo mandato da presidenta
Dilma Rousseff.
Singer é
pragmático ao comentar as recentes movimentações em prol do impeachment.
“Não defendo, mas, pela lógica, deveria passar. Afinal o Tribunal de
Contas da União [TCU] acatou – mesmo que a gente saiba que é em
cima de um argumento infundado. Sou contra. Para mim não é plausível
nem um pouco, mas para o TCU foi”, disse à reportagem da Fórum
em uma rápida conversa, na última quarta-feira (9), nos bastidores do
“Emergências”, evento do Ministério da Cultura que acontece no Rio de
Janeiro até o próximo domingo (13). Na ocasião, o economista participou
do debate “Fissuras no Capital”, que discutia as mazelas do sistema
financeiro capitalista e apresentava alternativas em economia solidária e
comunitária.
Crítico e
fiel às suas raízes de esquerda, Singer teceu duras críticas ao governo
Dilma e apontou o chamado “ajuste fiscal” como o principal algoz deste
mandato. Para ele, é justamente o pacote de medidas austeras propostas
pelo ajuste que criaram a crise econômica que o país vive e, como
consequência, a crise política e a perda de credibilidade do partido
diante de suas bases sociais.
“A política da Dilma é um baita fracasso. Está pior do que nunca (…) O ajuste fiscal é o suficiente [para que o partido se desgaste ainda mais]. Não vai sobrar nada [da base social da legenda].
O ajuste fiscal é a causa da crise”, afirmou, ressaltando ainda que a
única saída plausível para que o PT e o governo recupere suas bases é
“convencer a parar com o ajuste e recuperar a economia do Brasil”.
À frente
da Secretaria Nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE) por doze anos – o economista foi afastado do cargo este
ano como uma estratégia de fortalecer laços com o PDT –, Singer, apesar
das críticas, é otimista em relação ao futuro da esquerda no Brasil pelo
próprio legado que deixou como secretário. “O Brasil mudou desde o
governo Lula e hoje uma boa parte da economia já não é mais apenas
capitalista”, disse, fazendo referência ao fato de que a economia
solidária já representa, atualmente, 3% do PIB nacional.
Em pouco
mais de cinco minutos e a caminho do carro que seguiria para Brasília, o
sociólogo de 83 anos, que sofre para andar, mas faz questão de falar e
participar de todo e qualquer evento sobre política, esquerda ou
economia, falou também sobre a relação do governo com o PMDB, a carta do
vice-presidente Michel Temer a Dilma e o avanço conservador no Brasil e
na América Latina Confira.
Fórum
– O que acha do fato de o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, ter
autorizado a abertura do processo de impeachment? Acha que vai para
frente, que há o risco de afastamento da presidenta?
Paul Singer –
É muito difícil de prever. Não defendo, mas, pela lógica, deveria
passar. Afinal o TCU acatou – mesmo que a gente saiba que é em cima de
um argumento infundado.
Fórum – E o que o senhor acha do pedido de impeachment em si?
Singer – Sou contra. Para mim não é nem um pouco correto. Mas para Tribunal de Contas foi plausível…
Fórum – De maneira geral, que avaliação o senhor faz do governo?
Singer – Eu acho que a política da Dilma é um baita fracasso, está pior do que nunca. Mas impeachment não é o caminho.
Fórum
– Você citou, em outras ocasiões, que o ajuste fiscal vai fazer o PT
perder sua base social. Enxerga outros pontos no governo que acha que
podem fazer a imagem do PT se desgastar ainda mais?
Singer – O ajuste fiscal é o suficiente. Não vai sobrar nada [de base social].
E eu diria que, nesse mandato, vai ser muito difícil de melhorar porque
ela está de mal a pior e não muda de política. O ajuste fiscal é a
causa da crise e ela não consegue nem explicar a ninguém para que que
serve.
Fórum – Como fundador do PT, você vê algum caminho para que o partido saia da crise que o assola?
Singer – Sim, vejo. Convencer a Dilma a parar com isso [o ajuste fiscal] e recuperar a economia do Brasil.
Fórum – O que o senhor achou dessa carta de ruptura que o vice-presidente Michel Temer enviou a Dilma?
Singer – O homem está louco para ficar no lugar dela. Isso agora está explícito. Mas foi um tiro no pé dele mesmo.
Fórum – Acredita que esse embate com o PMDB pode polarizar os dois lados e ser benéfico para o PT?
Singer
– Polarizar, polariza… Mas, sinceramente, não sei prever. Muito
difícil, porque o governo está nas mãos do Tribunal de Contas e do
próprio PMDB. Aliás, tem gente no PMDB que parece que é contra o
impeachment, outros estão loucos para fazer, porque assim ganham cargos.
Fórum
– Considera que no atual ambiente político e social há espaço para o
surgimento de um partido de esquerda com a mesma força e que resgate os
princípios do PT, que o senhor ajudou a fundar?
Singer –
É uma ótima pergunta, mas a resposta é bem difícil. Certamente o
ambiente é propício, alguma coisa terá que surgir. Mas acho que ainda
leva mais tempo.
Fórum – Quais as suas expectativas para o futuro da esquerda no país?
Singer –
As expectativas são boas, porque o Brasil mudou desde o governo Lula e
hoje uma boa parte da economia já não é mais apenas capitalista. Também
não é uma ditadura stalinista, graças a deus.
Fórum
– Ao que credita o avanço conservador em voga no país? Acha que isso
pode ser um combustível para uma guinada à esquerda do PT?
Singer –
Quanto ao PT, tudo ainda é muito difícil de afirmar. Agora, está, de
fato, havendo uma onda conservadora em toda a América Latina. E o Brasil
está entrando nessa onda também.
Fórum – E de onde acha que vem essa onda conservadora que se perpetua pelo continente?
Singer –
É porque a burguesia ainda está aí, eles sempre estiveram. Só que agora
estão focando na oportunidade das crises pelas Américas para tomar o
poder. Tivemos uma década de maioria de governos progressistas e essa é a
melhor oportunidade para eles.
Fórum
– Acha que essa onda conservadora na América Latina pode se firmar e
voltarmos a ter um cenário parecido com os governos neoliberais dos anos
1990?
Singer –
Depende, se eles fizerem a política que a Dilma está fazendo, está
ótimo para nós, porque mesmo com tudo isso não chega a ser como a
direita desses países. Se não fizerem, estamos perdidos.
(Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)
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