Também é citada a inacreditável afirmação proferida pelo presidente do STF Gilmar Mendes ao ser sabatinado pelo jornal Folha de S. Paulo, de que a decisão do Supremo extinguiria a possibilidade de apelo à clemência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva -- uma derrapada tão desastrosa que Mendes nunca mais a repetiu, pois implicitava prejulgamento do caso, concordância prévia da maioria dos ministros com uma pretensão aberrante e a usurpação de uma prerrogativa do Executivo pelo Judiciário.
Às vésperas da apreciação no STF do pedido de extradição formulado pelo governo Berlusconi marcada para esta 4ª feira (9), é recomendável que todos leiam e reflitam (principalmente os ministros do STF, sobre os quais pesa a responsabilidade de resgatar a credibilidade da instituição, abalada por decisões polêmicas e pelas sucessivas declarações estapafúrdias que Mendes faz à mídia):
"A Itália pediu e obteve o privilégio de não ser apenas litigante, mas também parte da acusação: uma espécie de Ministério Público de Ultramar. Um fato insólito que, até onde eu pude pesquisar em processos internacionais, não possui antecedentes, é que o relator do processo, Cézar Peluso, consultou ao governo de Itália sobre todos os pedidos da defesa de Battisti, especialmente os relativos a sua liberdade. Curiosamente, o relator acatou servilmente as 'decisões' da Itália, salvo uma.
O judiciário brasileiro violou no caso Battisti todas as garantias judiciais estabelecidas na Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (CADH).
A CADH reitera o antigo direito de que toda pessoa deve ser considerada inocente, até que sua culpabilidade seja provada. Entretanto, em declarações feitas à mídia, membros do STF fizeram insistente alarde de que o destino de Battisti seria a extradição. Um dos argumentos foi que a jurisprudência seria modificada com essa finalidade.
No caso do Brasil, a jurisprudência sobre direito de asilo, refúgio e extradição para ações políticas tem sido (...) favorável ao acolhimento do perseguido. Se houvesse causas fundadas, ela poderia ser alterada através de um processo demorado que exigiria grande consenso e fundamentação. Como se trata da tradição jurídica mais importante do Brasil, sua rejeição só poderia justificar-se com base numa mudança radical da sociedade brasileira. É insano pensar que a aparição de apenas uma pessoa pode produzir essa mudança!
Mas, em 02/2009, o ministro do STF Celso de Melo admitiu publicamente a existência de um “truque” (obviamente, ele não o chamou assim) para condenar a Battisti, mudando a jurisprudência “de medida” para o caso Battisti. Veja um dos muitos sites que reproduzem esta notícia.
Este infame comentário, enfeitado com algumas divagações filosóficas, é uma amostra muito clara de que Battisti está sendo tratado previamente como culpado.
A mesma atitude foi adotada pelo presidente do STF, Gilmar Mendes, ao advertir que o Governo deveria acatar a ordem de extradição, caso o STF se declarasse a favor dela.
Outra cláusula da CADH violada pelo STF no caso Battisti é a exigência de que toda pessoa possa apresentar petições respeitosas que devem ser respondidas pelas autoridades. Battisti pediu durante muito tempo o direito a ser escutado pelo Tribunal. Inclusive, o prestigioso senador Eduardo Suplicy (...) se dirigiu no dia 11 de fevereiro ao STF informando de que o réu tinha redigido uma declaração que gostaria fosse lida pelos magistrados. Entretanto, essa petição (que não poderia ter sido mais respeitosa) não teve resposta.
Ainda mais grave é a violação de um princípio da CADH que afirma que todo preso tem direito à verificação da legalidade de sua prisão, e a ser julgado sem demora ou, então, a ser liberado. A justiça brasileira não se incomodou com verificar a legalidade da prisão de Battisti. De fato, ele estava detido sem acusação concreta nenhuma, no melhor estilo das detenções da época da ditadura. Obviamente, não pode aduzir-se a periculosidade do réu, já que em 28 anos de exílio, todas as testemunhas de sua vida, e não apenas os amigos, coincidiram em sua total adaptação as leis dos lugares que habitava.
Quando Battisti seja julgado, terá havido uma demora de 'apenas' 30 meses.
Inclusive o procurador geral da República (...) foi bastante consistente ao propor o arquivamento do pedido de extradição, e considerar que a atitude do ministro Genro tinha sido juridicamente correta. Ou seja, a prisão de Battisti, além de uma gentileza ao sadismo dos fascistas itálicos, é um ato injustificado que viola claramente a CADH.
Em 13 de março de 2009, os advogados de Battisti apresentaram seu quinto pedido de liberdade para o refugiado, se baseando agora no fato de que o processo está prescrito, pois já se passaram 20 anos desde a data em que ele foi condenado.
O governo italiano se manifestou contra o pedido com extrema rudeza, acusando aos advogados de má fé, de desonestidade profissional e de outras injúrias pesadas, e acabou negando que uma pena de prisão perpétua tenha prescrição. No entanto, mesmo nos casos mais iníquos, o país asilante é que deve decidir isso de acordo com suas próprias leis. Isto acontece inclusive nas sociedades com processos penais arbitrários e autoritários, como o Paquistão. Portanto, Brasil deve ter em conta que a pena máxima a que Battisti poderia ser condenado se fosse extraditado, seria de 30 anos. Nesse caso, o processo correspondente prescreve aos 20 anos.
Um hábito do relator do caso Battisti é contrário a ambos, aos direitos humanos do preso e à autonomia do Estado Brasileiro. É a sua subserviência superlativa e sua cumplicidade com os acusadores. Não é exagerado dizer que, excluindo países onde o direito é absolutamente arbitrário (como as teocracias islâmicas, p. ex.), é difícil encontrar um caso comparável. Pode pensar-se que o governo italiano está julgando Battisti usando os magistrados brasileiros como simples procuradores."
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