sábado, 23 de janeiro de 2010

MÁRIO DE ANDRADE E SÃO PAULO - POESIAS



















Paisagem N.° 3

Chove?
Sorri uma garoa de cinza,
Muito triste, como um tristemente longo...
A Casa Kosmos não tem impermeáveis em liquidação...
Mas neste Largo do Arouche
Posso abrir o meu guarda-chuva paradoxal,
Este lírico plátano de rendas mar...

Ali em frente... - Mário, põe a máscara!
-Tens razão, minha Loucura, tens razão.
O rei de Tule jogou a taça ao mar...

Os homens passam encharcados...
Os reflexos dos vultos curtos
Mancham o petit-pavé...
As rolas da Normal
Esvoaçam entre os dedos da garoa...
(E si pusesse um verso de Crisfal
No De Profundis?...)
De repente
Um raio de Sol arisco
Risca o chuvisco ao meio.

Garoa do Meu São Paulo

Garoa do meu São Paulo,
-Timbre triste de martírios-
Um negro vem vindo, é branco!
Só bem perto fica negro,
Passa e torna a ficar branco.

Meu São Paulo da garoa,
-Londres das neblinas finas-
Um pobre vem vindo, é rico!
Só bem perto fica pobre,
Passa e torna a ficar rico.

Garoa do meu São Paulo,
-Costureira de malditos-
Vem um rico, vem um branco,
São sempre brancos e ricos...

Garoa, sai dos meus olhos.

Inspiração

“Onde até na força do verão havia
tempestades de ventos e frios de
crudelíssimo inverno.”
Fr. Luís de Sousa

São Paulo! Comoção de minha vida...
Os meus amores são flores feitas de original...
Arlequinal!... Traje de losangos... Cinza e ouro...
Luz e bruma... Forno e inverno morno...
Elegâncias sutis sem escândalos, sem ciúmes...
Perfumes de Paris... Arys!
Bofetadas líricas no Trianon... Algodoal!...

São Paulo! Comoção de minha vida...
Galicismo a berrar nos desertos da América!

(fotos: Largo do Arouche, Parque Trianon etc)




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