sábado, 20 de junho de 2015

O MAESTRO E A FILARMÔNICA DE VIENA - Otávio Martins (2ª publicação melhorada)


 


O MAESTRO E A FILARMÔNICA DE VIENA

Otávio Martins

Sinceramente, em certos momentos, a meu ver ele juntava entre as mãos, todo o som que vinha da grande orquestra. Depois, sorria, como se quisesse dizer, com aquele punhado de notas que, agora, ao espalhá-las pelo ar, era, exatamente, como havia planejado e pensado, ou imaginado, sabe-se lá. Como se aquilo tudo o que estava acontecendo, fosse o resultado do que ele esperava daqueles músicos; aparentemente, sem a mesma projeção de um dirigente de orquestra, mas, cada um, com a sua contribuição e participação importantíssimas, pessoal, seja qual fosse o instrumento. Interessante, também, era quando alguns, ou pequenos grupos, tocavam alguma parte
como se muitas fossem, as partes da música – davam a impressão, embora se ouvissem tantos outros, de que estavam sozinhos; tocando aos seus bels prazeres. Nada, tinha um monte deles, de outros naipes, a sustentar, como se fora uma esteira, aquela linda emissão de sons. Acho que era o acompanhamento. Sei lá, não sei bem como é que isso funciona. No comecinho, juro, fiquei com medo. Apreensivo pelo sujeito que, parecia, tocava solitário, uma flauta, que chamam de transversal. Acompanhamento (ou solo, vai saber!) somente uma caixa, branquinha, que, teimosamente, repetia os compassos iniciais, do mesmo jeito que havia começado. E, assim, foi-se por toda a apresentação, de cabo a rabo, entravam e saiam instrumentos; em certos momentos até a orquestra inteira; e ele lá, impassível, repetindo aqueles primeiros compassos, daquele jeitinho que havia começado. Pensei: Será que é assim, mesmo? Ou ele tem medo de arriscar-se? Outros sopros iam-se revezando. Depois, com o avançar da música, juntavam-se, em plena solidariedade. Cada vez mais alto. Eu já estava achando a participação das tais cordas – violinos, violas, celos, contrabaixos – e outros, muito contida. Será que iriam ganhar a mesma coisa? Só faziam pim, pim, pam, pam, com as pontinhas dos dedos. Pra ser honesto, tinha lá o seu efeito. Os sopros não paravam de entrar e sair. Acho que uns ajudavam aos outros na hora do aperto. Até uma harpa, fazendo, o mesmo que outras cordas – pam - pam - com a pontinha dos dedos. Sabem aquele cara da caixa que falei agora há pouco? continuava na mesma batidinha: Tan-tan-tan-tan/tan-tan-tan-tan/Tan-tan/Tan-tan-tan-tan/Tan-tan-tan-tan-tan-tan-tan. Repetia, de forma acintosa, cada vez mais alto, aqueles benditos primeiros compassos. Apesar daquele monte de instrumentos, mais os respectivos acompanhamentos, a intensidade aumentava, mas, a música, parecia sempre igual. Já beirava os quinze minutos. Aí, sim, me caiu o queixo, As tais cordas, atacaram, pra valer. Agora, seguramente, fariam jus ao cachê. Mas a música, sensação estranha, patinava e andava e, ainda, por cima ficava mais alta. Mais bonita. O maestro, a bem da verdade, pra mim, não estava mais regendo. Fazia lá uns trejeitos; abria os braços; usava o dedo indicador da mão esquerda como se fora uma segunda batuta, apontando ora para uns e, ora para outros músicos. Sempre com aquela cara de satisfeito. Certamente os músicos ainda estavam correspondendo às suas expectativas. Acho que alguns, os quais estavam na plateia pensaram que nem eu: afinal, este tabladinho aí é pra reger ou pra dançar? Deixei pra lá. Cada um com o seu cada um. Como todo maestro, chegando ao fim, escabelou-se. Tinha um cara, acho que tocava um trombone de vara, assim, como se estivesse no quintal da casa dele. Tocando como bem entendia. E como entendia! E a música patinando e andando. Que sensação estranha. No final, sinceramente, não entendi. Achei que tinham desafinado. Acho que, até, trocaram, ou tropeçaram no tom, sei lá. Mas, todo mundo aplaudiu. Os tais entendidos. Sinal de que era assim, mesmo. Essas são as minhas considerações a respeito do Bolero de Ravel, com a Orquestra Filarmônica de Viena, sob a batuta do ótimo maestro, venezuelano, Gustavo Dudamel. Ê turminha danada, sô!

*1ª publicação com o vídeo, ouça em:



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