E
O MUNDO NÃO SE ACABOU
Otávio
Martins
Anunciaram e garantiram que o mundo ia
se acabar
Pela rua, distraído, comecei a cantarolar o samba “E o mundo
não se acabou”, do Assis Valente. Uma viagem no tempo. Até agora,
nada. Preocupação que só acabará pensei, se o mundo, realmente,
se acabar.
Vali-me da experiência do Assis Valente, logo que começaram,
novamente, a anunciar que o mundo, em 2012, lá pra dezembro, irá se
acabar. Não vesti maiô; não beijei a quem não devia; não perdoei
ninguém – trago-os na conta, ainda. Isso tudo ia “acontecendo”
enquanto eu ia caminhando por aquela rua deserta, durante uma
madrugada quente. Tão confusa a situação, que eu mudava de ideia a
todo o momento. Muitas dúvidas. Por alguns momentos, dava a
impressão que eu estava passeando pelo fim do mundo. Para
confundir-me, mais ainda, lembrei que algumas pessoas costumam dizer
que aqui, onde moro, é o fim do mundo. Com essa afirmação, quase
deixei pra lá. Afinal de contas...
Assis Valente compôs esse samba em 1938. Depois de vinte anos, o
mundo não se acabou, porém, Assis Valente resolveu dar cabo ao seu
mundo. Na terceira tentativa de suicídio, num banco de praça,
ingerindo um pequeno frasco de formicida. Como lhe haviam anunciado e
garantido, mais tarde, fez o que fez. E o mundo se acabou. Pelo menos
pra ele.
Por um breve instante lembrei-me de quando deixei São Paulo. Ali
no bar do Zé, na Maria Antonia, tinha muito neguinho sumindo,
fiquei com o fiofó na mão e me fui, sem muito pensar, passar uma
temporada na Cidade Maravilhosa. Cidade de Assis Valente. Lá,
ninguém me conhecia. Pelo menos não precisava andar me cuidando,
feito um louco, apreensivo. De cara, fui trabalhar numa fábrica de
confecções (roupas de praia), perto do Campo de Santana; na Rua da
Constituição. Eu, hein? Tinha um cara lá, duma religião
qualquer, que nem lembro o nome; meu colega de mesa, super-religioso.
Minha função? Notista. Eram os calções, sungas e outras
coisas, que eu ia colocando com o preto no branco. Depois, era só
entregar e receber. O cara, acho, tentando me assustar, dizia que o
mundo estava por se acabar.
Numa tarde, depois do trabalho – costumava ir para a Biblioteca,
ali na Cinelândia – foi eu pisar o pé naquele espaço, uma
“manifestação” relâmpago. Anunciavam os sujeitos que teria uma
passeata monstro. Depois, conhecida como a dos cem mil. Diziam
que era pra acabar com a “revolução”. Nem o mundo se acabou,
nem a revolução. Veio
E O MUNDO NÃO SE
ACABOU
o tal de AI 5. Depois, pior, um conterrâneo meu (Bagé – RS), na
sequência, meteu os pés,
com coturnos e tudo, pelas mãos. Isso era 1968, trinta anos depois
que o Assis Valente havia feito o seu samba, E o mundo não se
acabou. Provavelmente, ali por perto, Rua da Lapa ou Largo do
Estácio, talvez. Sei, não. Acho que é por causa daquela turma do
Noel, ligo todos os sambistas à Rua da Lapa ou ao Estácio.
Deixei o Assis Valente pra lá – os compositores brasileiros, a
gente nunca sabe se estão falando sério, vivem inventando coisas...
– fui direto para o mais comentado de todo mundo. “Estive” lá
pelos meados do século XVI. Nostradamus. Esse está escrito em tudo
que é lugar sabia das coisas. Do seu tempo e dos tempos que ainda,
até o dia em que o mundo se acabasse, viriam. Catei nos nichos da
minha memória o que eu já tinha ouvido, ou lido, sobre esse cara.
Considerado o maior profeta de todos os tempos. Não deixou pra
ninguém. Falava, parece de coisas concretas. Não em crenças, ou
invencionices. Até os Maia consultei. Claro, pesquisei outros. Uns
garantiram, até, que outro mundo teria quando este se acabasse. Uma
espécie de mundo eterno. Infinito. Não é como o amor, na visão do
Poetinha, “que seja eterno enquanto dure”. É infinito pra
mais de metro; o eterno de certos profetas, até para alguns poetas.
Umas simples noções sobre o apocalipse, também me inteirei. Porém,
nada que preocupasse muito. Ainda, trazido por uns reles cavaleiros.
Não chega a meter medo, pra valer.
Eu estava - falando sério - preocupado e ensimesmado com a ideia
do fim do mundo, propriamente dito. Tenho lido e estou perfeitamente
informado, jornais, revistas, TVs, rádios, Internet e, até, no boca
a boca; todos são unânimes – batata - 2012 é o fim. Já nem faço
mais planos para 2013. Caso o mundo não se acabar em 2012, nem sei o
que será de mim. O fim do mundo, em 2012, será a minha tábua de
salvação. Tem gente que, por qualquer coisinha à toa, exclama: É
o fim do mundo! É só força de expressão. Por vezes, dizem
só por dizer.
Pelos meus cálculos, com base nas profecias desse tal de
Nostradamus, os Maia, e outros, não precisarei nem me preocupar em
ir reservando alguns trocados para presentear os meus parentes e
amigos no “próximo” Natal. Ontem, saí dos eixos, total...
Comprei uma garrafa de uísque importado. Larguei os nacionais.
Economizar, pra quê?
Pensando assim, lembrei-me duma outra do Assis Valente, “Eu
pensei que todo mundo fosse filho de Papai Noel...”
Mesmo que 2013 venha, apesar de todas essas profecias, será, sem
dúvida, um ano inteiro de muito azar. Treze, com um zero à
esquerda, é treze, mesmo. É esperar pra ver. Ou bater, três vezes,
na madeira.
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