A revista Época chega às bancas neste sábado (14) com uma matéria de capa sobre a participação da presidenciável Dilma Rousseff na luta armada.
Eumano Silva, um dos autores (ao lado de Leandro Loyola e Leonel Rocha), é meu velho conhecido e colega de editora: em parceria com Taís Morais, escreveu Operação Araguaia.
A reportagem em si é reconstituição histórica, a mais objetiva e neutra possível se considerarmos as limitações da grande imprensa. A Veja, tratando do mesmo assunto, decerto produziria um aberrante panfleto ultradireitista.
Cheguei a dar depoimento um tanto inconclusivo, já que conheci brevemente a Dilma durante o Congresso de Teresópolis da VAR-Palmares (outubro/1969) e nossos caminhos jamais se cruzaram de novo. Não acrescentaria mesmo nada e Eumano fez bem em deixá-lo de lado.
Cheguei a dar depoimento um tanto inconclusivo, já que conheci brevemente a Dilma durante o Congresso de Teresópolis da VAR-Palmares (outubro/1969) e nossos caminhos jamais se cruzaram de novo. Não acrescentaria mesmo nada e Eumano fez bem em deixá-lo de lado.
Mas, independentemente da integridade ou não do trabalho jornalístico, o tema é espinhoso para Dilma e para o PT, daí ela ter se recusado a atender aos pedidos de entrevista da Época e a deplorável nota que sua assessoria de imprensa emitiu:
".Dilma não participou [de ações armadas], não foi interrogada sobre o assunto e sequer denunciada por participação em qualquer ação armada, não sendo nem julgada nem condenada por isso.
"Dilma foi presa, torturada e condenada a dois anos e um mês de prisão pela Lei de Segurança Nacional, por 'subversão', numa época em que fazer oposição aos governos militares era ser 'subversivo'".
Quantas ressalvas! Na minha humilde opinião, de tudo que li na reportagem, o trecho mais nocivo à imagem de Dilma é este, pois, em contraste com sua verdadeira trajetória, nem de longe mostrada de forma negativa, soa terrivelmente falso.
Ambos, Dilma e o PT, têm preferido deixar o passado no limbo, como um estorvo, do que explicar francamente às novas gerações que o Brasil de Médici chegava a lembrar, em muitos aspectos, a Alemanha de Hitler, a Espanha de Franco ou o Chile de Pinochet: um festival de horrores e atrocidades.
Para não indisporem-se com velhos gorilas e novos autoritários, eles não dão, salvo quando a imprensa e os adversários políticos os encostam na parede, o merecido destaque às bestialidades que os tiranos cometeram, nem à bravura dos que os combateram.
Então, quando as viúvas da ditadura acusam falsamente Dilma Rousseff de assaltar bancos, sequestrar diplomatas e outras ações armadas, as novas gerações, desinformadas, tendem a vê-la e julgá-la a partir dos parâmetros atuais, como se tivesse sido uma criminosa do PCC.
Se soubessem que enfrentávamos algo próximo a uma Gestapo, em condições de extrema inferioridade de forças, poderiam nos olhar como os franceses olham sua Resistência, dela orgulhosos por haver salvado a honra do país.
Fugir do dever, entrentanto, nunca é resposta para nada.
O dever de quem enfrentou a tirania é manter viva a lembrança dos anos de chumbo, até para criar, nos que vieram depois, anticorpos contra o totalitarismo.
Esquivando-se do assunto em circunstâncias mais amenas, os petistas serão obrigados a defrontarem-se com ele no auge da campanha eleitoral.
Então, é o momento de abandonarem de vez as esquivas, declarando em alto e bom som: quem resistiu à ditadura mais brutal que o Brasil conheceu, tinha todo direito de pegar em armas contra os déspotas e merece, acima de tudo, o reconhecimento da cidadania.
E isto vale tanto para Dilma, que não entrou na ação direta, como também para Carlos Lamarca, Carlos Marighella, Eduardo Leite, Devanir de Carvalho e outros que usaram a força contra um inimigo que pela força usurpou o poder e pela força nele se mantinha: todos eles, indiferenciadamente, foram heróis e mártires deste sofrido país!
Nada de tergiversações. Quem participou da luta armada, cumpriu as funções que seu agrupamento lhe designou. Se, como Dilma e eu, acabou recebendo outras incumbências, isto era irrelevante do nosso próprio ponto de vista e só estabelecia distinções entre nós aos olhos do inimigo, quando tratava de nos enquadrar nas suas leis draconianas, características de um regime de exceção.
Então, a postura digna nunca será a de se desculpar com afirmações tipo "estava lá mas não fiz isso ou aquilo", mas sim a de proclamar que "estava lá e faria tudo que fosse necessário, porque nossa luta era justa e confrontávamos o despotismo mais hediondo".
É o mínimo que podemos fazer, pela nossa honra e por respeito aos companheiros que tombaram.
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