domingo, 11 de julho de 2010

DE COMO O ESTADO MATA OS SEUS CIDADÃOS


Bookmark and Share  Há várias maneiras, sendo a mais conhecida as guerras. Nessas ocasiões, por “razões de estado”, os cidadãos fardados são enviados para morrer nas frentes de batalha. E todos sabemos que quem vence as batalhas são os generais e quem as perde são os soldados.

     Mas há maneiras mais sutis, embora cotidianas. A pior é a exploração da força de trabalho dos cidadãos, que somente serão considerados como cidadãos enquanto se mostrarem produtivos. Após o período de produtividade, o trabalhador é aposentado, já velho, com bem menos do que recebia enquanto era tido como uma pessoa inteira. Mas, até lá, se tiver a sorte de conseguir um emprego, será explorado durante toda a vida, com breves períodos de descanso, chamados de “férias”, que servem justamente para que o trabalhador recobre suas energias de alguma maneira para, depois, voltar a ser explorado com mais força ainda.

     O explorado trabalhador não tem o direito de adoecer. Quando isso acontece – o que é muito comum entre os mortais – ele continuará a ser explorado até a sua morte, mesmo doente, porque o todo poderoso Estado – essa entidade intocável, que pertence a poucos – não permite a doença ao explorado trabalhador doente. Para isso, o inefável Estado dos muito poucos exploradores, que usufrui da força de trabalho da multidão dos explorados trabalhadores, usa de vários artifícios. Um deles – talvez o principal - é a perícia médica.

A PERÍCIA MÉDICA

     A perícia médica é um artifício utilizado pelo Estado para dizer ao cidadão doente que ele não está doente. Teoricamente, a perícia médica deveria averiguar qual a doença da pessoa - através dos sintomas apresentados e de exames clínicos e laboratoriais -, a gravidade dessa doença e, após tudo isso, diagnosticar as suas reais condições de trabalho. Caso o aposentado não tenha condições de trabalhar, deve ser recomendada a sua aposentadoria. Isto, teoricamente.

     Mas sei de casos escabrosos. Acredito que todos saibam que, atualmente, médico é uma pessoa que faz um curso de Medicina com o principal objetivo de ganhar muito dinheiro, depois de formado. Raros são os médicos que realmente tem vocação, que gostariam de ver os seus pacientes curados. Mesmo porque, salvo exceções, médico não cura, passa receitas. Não fossem os laboratórios e a indústria química e farmacêutica, a profissão de médico estaria acabando. Salvar-se-iam os cirurgiões, para casos de extrema gravidade. Por outro lado, a profissão de enfermeiro estaria bem mais valorizada.

     E os peritos são os médicos. Quando um trabalhador explorado vai a uma perícia médica, com o objetivo de requerer aposentadoria ou algum outro benefício, é porque está doente. Há casos de malandragem, mas são as pouquíssimas exceções. Ocorre que os peritos médicos tratam a todos os periciados como se fossem malandros e mentirosos. Talvez sejam orientados para isso: o Estado não quer pagar pelo que não recebe; e o que o Estado recebe de cada cidadão é, além dos inúmeros impostos, a sua força de trabalho. Quando algum trabalhador fica doente e é aposentado o Estado o trata como um cidadão de segunda classe, como um peso, um estorvo.

     Sei de um caso terrível. O trabalhador perdeu uma perna e foi periciado por um traumatologista. Requeria a sua aposentadoria. O médico disse a ele que poderia trabalhar com a outra perna e auxílio de uma muleta. O trabalhador voltou para a sua casa, pegou uma arma e voltou para atirar no médico. Queria atirar nas pernas do médico. Gritava: “agora tu vai ver o que é trabalhar só com uma perna!” Não conseguiu o seu intento e, ao que eu saiba, continua trabalhando com a sua única perna.

     Sei de uma pessoa que sofre do coração e hipertensão e poderá cair morta a qualquer momento – mas a perícia médica negou a sua aposentadoria e ela continua trabalhando. Sei de outro caso, de uma pessoa que faz serviços gerais em uma escola e que ficou incapacitada de trabalhar com um dos braços. A resposta do perito foi: “a senhora poderá trabalhar com o outro braço e com o auxílio de uma bengala”.

     E sei de um caso tão terrível quanto os anteriores, mas que tem requintes de crueldade (se me permitem o clichê).

     Uma trabalhadora explorada do Estado está sendo ameaçada de exoneração por não poder trabalhar. Inclusive, o Estado já entrou com processo contra ela. É secretária de escola e tem vinte anos de serviço. Diversos exames clínicos e laboratoriais constataram que ela tem LER (Lesão por Esforço Repetitivo) no pulso direito, osteoporose e artrite reumatóide, que é uma doença auto-imune e incapacitante. As dores são cruciais e migram de uma parte para outra parte do corpo. Inclusive, por várias vezes já foi parar no Pronto-Socorro, e até chegou a tomar morfina para diminuir as dores. Toma bateladas de remédios para minimizar essas dores, que são agravadas por constantes crises de estresse e de ansiedade. E o Estado quer exonerá-la.

     É sabido que a artrite reumatóide pode provocar danos e lesões em órgãos internos. Órgãos vitais. É uma doença que pode levar à morte. E esta pessoa esta sendo processada pelo Estado por abandono das suas funções, abandono do cargo.

     E a perícia a trata, sempre a tratou, com desprezo e agressividade. Aliás, essa atitude de menosprezo com os periciados já é clássica nos médicos peritos.

     Apesar dos quilos de exames que constatam a sua doença, e mesmo os médicos peritos sabendo da gravidade dessa doença... Mesmo assim, os médicos peritos – pasmem! – dizem que ela não tem nada e que está apta para trabalhar.

     De tanto tomar remédios, os efeitos colaterais se fazem sentir: começou a perder os cabelos, a inchar o rosto devido à cortisona – que é um dos remédios que a faz sentir menos dores, mas que provoca depressão - a ficar com os dedos das mãos tortos, devido às lesões provocadas pela artrite; com perigo de problemas renais sérios, problemas no coração ou em outros órgãos vitais... E o Estado quer exonerá-la, porque não produz mais, não pode ser mais explorada e de tanto que foi explorada por esse Estado cruel e predador, ficou muito doente, incapacitada para o trabalho, com pouca força de vida, em constante estresse e crises emocionais.

     E tudo o que o Estado quer dar a ela é a exoneração. É uma maneira de matar. O Estado, quando não consegue mais explorar os seus trabalhadores, procura matá-los. Essa morte poderá ser lenta e demorar alguns anos, mas virá. É um assassinato silencioso, que não consta nos Códigos Penais. Mas que acontece diariamente.

     Se esta pessoa que eu citei – e que resguardo o nome – tiver sérios problemas em órgãos internos, o Estado não se importará com isso. Se ela falecer, o Estado apenas se sentirá aliviado.

Um comentário:

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