O Lançamento de Ao Pé do Muro na Cidade de Cananéia
Carlos Alberto
Lungarzo
Prof. Tit. (r) Univ. Est. Campinas, SP, Br.
26 de maio
de 2012
Na anterior sexta feira, dia 18 de
maio, o romance de Cesare Battisti Ao Pé
do Muro, editado por Martins Fontes, apresentado já em várias reuniões de
São Paulo e do Rio de Janeiro, foi também lançado em Cananéia, uma charmosa
cidade do litoral Sul localizada a cerca de 270 Km da Capital.
Este lançamento foi algo diferente
dos outros. Não foi feito numa livraria nem num anfiteatro, mas numa rua da
cidade, fechada aos veículos por disposição municipal e contou durante as
longas horas que durou o evento com a discreta proteção da Polícia Miliar do
distrito.
Os assistentes, que na hora pico somavam por
volta de 300 pessoas, celebraram, comeram e beberam num restaurante da rua. Ao
mesmo tempo, se deliciaram com o rock progressivo da banda,
muito boa, Siri na Lata, formada
por jovens de uma das cidades do litoral.
O evento foi um convite
especial de seus moradores e da Câmara Municipal, pois Cesare Battisti morou
nela durante quatro meses, pouco depois de sua soltura no dia 8 de junho de
2011. Muitos devem lembrar ainda que foi nessa cidade onde a Folha de S. Paulo fez uma reportagem
difamatória sobre o escritor italiano, publicando na capa fotos que visavam
prejudica-lo (embora não o conseguissem), abusando da confiança que os gentis e
solidários anfitriões de Battisti tinham depositado no repórter.
Nessa cidade, como acontece em
outros lugares onde morou, como Rio de Janeiro, e até em lugares onde apenas
transitou ocasionalmente (como Porto Alegre durante o Foro Mundial Temático, e
Fortaleza, onde fez um pré-lançamento do livro), Battisti ganha a simpatia geral das
pessoas da cidade. Estas apreciaram seu estilo cordial e transparente,
sua afabilidade, e sua capacidade de se entrosar nas conversas e nos problemas
de seus semelhantes.
Uma prova disso tivemos em Porto
Alegre, no final de janeiro, quando, passeando pelas ruas da cidade, era
frequentemente requerido para conversar e bater fotos com pessoas sozinhas,
homens e mulheres, e até com famílias com crianças. Na época, não houve uma
única provocação, o que parece mostrar que o povo, tanto o mais popular como a
classe média esclarecida, não engoliu os infames relatos da mídia, a campanha
de mentiras e o lixo mediático exportado pelos rancorosos mafiosos peninsulares
e sua sociedade de “amigos” remunerados.
Além dos aspectos pessoais, influiu o
sentimento hospitaleiro e cálido do povo brasileiro. E também a necessidade
moral de confrontar-se com uma gangue política estrangeira que tinha humilhado a
sociedade e todas suas instituições de uma maneira tão baixa como não é
possível lembrar outra na história moderna das sociedades ocidentais.
Mas, em Cananéia, não apenas o povo celebrou
o escritor que fora seu carismático vizinho durante alguns meses. No jornal A Tribuna, o mais conhecido e lido do
litoral santista e sulista, Battisti é tratado como o segundo homem famoso que
morou na cidade. (Vide)
De acordo com a tradição, o bacharel
português Cosme Fernandes, foi
abandonado em condição de degredado em
1502, na área onde seria construída a vila em 1531. O motivo deste desterro teria
sido o fato de ser judeu; por outras palavras, ele foi a primeira da barbárie teológica e racista vítima acolhida no
Brasil, por seus primeiros habitantes, os índios.
Fontes não totalmente confiáveis,
talvez inspiradas em fábulas românticas, o descrevem como um defensor dos
índios e um resistente contra a opressão colonialista portuguesa, mas pouco se
sabe ao certo.
Nada menos que 509 anos depois, um
novo alvo do delírio linchador (misturado agora com a ideologia do fascismo, da
máfia e do stalinismo, que na época de Cosme não existiam) trouxe outra
celebridade perseguida às deliciosas praias de Cananéia.
O evento foi organizado por diversos
grupos populares, entre eles, movimentos sociais e o Sindicato dos
Trabalhadores da Universidade de São Paulo (SINTUSP), mas foi visitado também
por setores da classe alta da cidade. De fato, em todo o Brasil, setores honestos
das elites se manifestaram contra a humilhante situação de ser tratados como
escravos de uma cultura decadente, dominada pelos padrinhos da Cosa Nostra, os
herdeiros de Mussolini e os imitadores de Stalin. Além disso, só mentes
doentias ou em franca falência podem gostar de ser considerados cúmplices
servis de um linchamento. É por isso que pessoas sadias, de qualquer condição
social, se mostram cada vez mais avessas a assumir as envelhecidas vinganças e ódios de psicopatas
irreconciliáveis.
Também alguns representantes da Câmara
Municipal se fizeram presentes. Tudo isto aconteceu no meio à sessão de
autógrafos, sob o ritmo estimulante da banda de rock.
A peça executada como despedida foi I
Want to Break Free, de Queen,
escrita em 1984 pelo baixista John Deacon, muito adequada ao momento. Ela foi
sempre considerada um hino contra a opressão e é uma composição vibrante e
profunda; algo necessário num mundo dominado por algozes e por uma moda musical
envenenada pela pieguice e a banalidade.
Foi um encontro festivo e de
confraternização, onde houve muitos interessados no livro, mas não se falou só em
literatura. Era uma oportunidade para os amigos se encontrarem junto ao mar,
símbolo da alegria e da liberdade, esquecendo os fornos onde, como dizem os
escritores franceses amigos de Battisti, se funde o metal do ódio e da
vingança.
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