sábado, 10 de outubro de 2009

Militantes contra a ditadura: heróis ou terroristas

Na comunidade do Orkut denominada "Ditadura Militar", que tenho o orgulho e a satisfação de presidir, meu amigo e companheiro Celso Lungaretti (grande jornalista e um dos baluartes da luta contra a ditadura militar brasileira) pediu-me que fizesse um pequeno estudo jurídico acerca da natureza criminosa das acusações de Brilhante Ustra (Coronel reformado do Exército que foi declarado torturador pela Justiça brasileira) contra os militantes contrários ao regime de exceção que aqui se instalara em março de 1964. Passo a reproduzir o estudo para que aqueles que ainda insistem em considerar as vítimas do golpe como delinquentes tirem suas conclusões

"Lungaretti tocou em uma questão absolutamente importante acerca dos escritos e das declarações do Ustra. Trata-se de algo que está passando de forma despercebida aos olhos dos juristas sérios deste país. Antes de tecer minha análise sobre tais colocações, acho salutar colocar as definições de calúnia, injúria e difamação, tudo de acordo com os arts. 138 ao 140 do Código Penal.

Calúnia

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.


Difamação

Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.


Injúria

Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Partindo das definições acima, façamos uma sucinta análise das recentes assertivas de Brilhante Ustra sobre os presos, mortos e desaparecidos políticos.

Quando o citado militar se refere àqueles que sofreram algum tipo de violência ou perseguição, por parte do Governo Militar, como "terroristas", sem destacar as condições sócio-políticas anormais em que tais agentes operaram, pratica "res, non verbis" o crime de calúnia (art. 138 do CP), na medida em que imputa, indevidamente (e com plena consciência desta situação), a alguém práticas delituosas. E é de bom alvitre salientar que, de acordo com o § 2º do referido art., "é punível a calúnia contra os mortos".

Mas por que não podem ser considerados terroristas os atos praticados pelos militantes de esquerda durante o regime de exceção?

A Carta de 1988 previu tratamentos distintos para os crimes terroristas e os crimes denominados políticos. De acordo com Sarmento:

"Para conceituarmos o que seja crime político, devemos buscar subsídios, via de regra, na Lei n°. 7.170/83, que define os crimes contra a Segurança Nacional e a Ordem Política e Social, estabelecendo o processo respectivo. Embasados na jurisprudência e neste diploma legal, pensamos que só haverá crime político, quando estiverem presentes na conduta praticada os pressupostos do art. 2º da Lei nº 7.170/83, ao qual devem se integrar os do art. 1º da referida Lei. Ou seja, a materialidade da conduta deve lesar real ou potencialmente ou expor a perigo de lesão a soberania nacional e a ordem política, de forma que, ainda que a conduta esteja tipificada nos artigos da Lei de Segurança Nacional, será preciso que se lhe agregue o principal fator de configuração do crime em estudo: a motivação e objetivos políticos."

Entretanto, de acordo com o mesmo autor:

"Não se deve caracterizar os atos praticados contra a ditadura militar como crimes políticos ou de terrorismo. Até porque, de acordo com a definição do art. 2º da Lei 7.170/83, foram os golpistas de 1964, e não os insurgentes de esquerda, que subverteram a ordem constitucional vigente, estabelecendo, sob a égide da violência, do terror e do medo, uma nova "ordem" político-institucional, sem qualquer salvaguarda dos princípios básicos atinentes à fundamentação da soberania democrática do Estado.

Ademais, a própria Lei da Anistia (que os próprios militares citam como uma lei pactuada democraticamente, mas não passou de mais uma decisão unilateral dos juristas da repressão) deixou de punir crimes considerados políticos. E se deixou de punir, excluiu a própria antijuridicidade destes atos. Destarte, as assertivas de Brilhante Ustra são criminosas sob ótica do Código Penal, sob a ótica da Carta Política e até mesmo sob a ótica da Lei da Anistia.

Portanto, é importante ter em mente que pelo fato de o Poder Judiciário estar impedido de apreciar matéria política, por força do art. 11 do odioso Ato Institucional nº 05, de 13 de dezembro de 1968, e pelo fato de o Congresso Nacional ter sido abruptamente silenciado pelo Poder Executivo (que se pretendia moderador), não podem ser tomados como terroristas os atos praticados pelos militantes contrários ao regime militar. Os atos terroristas pressupõem, por definição, uma situação de normalidade democrática e uma concreta ameaça a esta normalidade oriunda de grupos armados e organizados (terroristas). O que havia, durante os tão famigerados anos de chumbo, era uma situação atípica na qual a opressão e a turbação às instituições democráticas partiam do próprio governo, este sim terrorista e com atitudes notadamente liberticidas"

All Mon


FONTE : http://hedonistapolitizado.blogspot.com/2009/09/militantes-contra-ditadura-herois-ou.html

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