quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Antunes Filho homenageou Carmem Miranda e Kazuo Ohno no XIV Festival de Teatro de Curitiba - 2005

ANTROPOFAGIA TEATRAL - ABRIL DE 2005


por Franco Caldas Fuchs ( francofuchs@hotmail.com )

Imaginem como eu estava ansioso para assistir à peça Foi Carmem Miranda , de Antunes Filho, durante o XIV Festival de Teatro de Curitiba. Pela primeira vez, finalmente, eu teria diante de mim uma das lendas do teatro nacional, célebre por montagens como Macunaíma , A Hora e a Vez de Augusto Matraga , Nelson Rodrigues – o Eterno Retorno e tantas outras.

Todavia, não pensem que eu não guardasse lá minhas reservas quanto a essa peça apresentada no Teatro da Reitoria. Primeiro, porque nunca fui fã de Carmem Miranda. Segundo, porque sou um cara um pouco conservador. “Quadrado”, por assim dizer. Lendo a sinopse e sabendo que não tinha um enredo muito definido, que era dança-teatro... Confesso que não me agradou muito. Mas lá fui eu.

Antes de começar a falar da peça, é preciso que o leitor saiba que Foi Carmem Miranda presta duas homenagens: à pequena notável, Carmem Miranda, e a Kazuo Ohno, o criador do teatro Butoh. Este ano comemora-se o cinqüentenário da morte de Carmem e o centésimo aniversário de Kazuo. Inclusive, após o festival o grupo teatral responsável viaja para Tóquio numa apresentação exclusiva para Ohno.

Mas, mesmo entre tantas deferências, o importante é saber como saiu a peça, o produto final. Parece que Antunes seguiu mesmo a linha dos seus últimos espetáculos prêt-à-porter: cenas curtas criadas a partir da improvisação dos atores e praticamente sem cenário ou iluminação. No elenco, quatro atrizes se revezam mostrando facetas, variações do mito. Tem a “Carmem-criança” (Juliana Galdino), a “Carmem-japonesa” (Emily Sugai), a Carmem, digamos, mais “padrão” (Arieta Corrêa) e até o malandro carioca (Paula Arruda).

A peça inicia com a pequena sozinha no placo. Aos poucos ela vai se descobrindo, dançando e dublando sua música inconfundível. Depois, a garota descobre num baú os objetos que irão compor sua imagem eterna: um turbante cheio de frutas e laços coloridos. Curioso como mais tarde esse turbante adquire a forma, a mesura de uma armadura samurai. As marchinhas e os maxixes dão lugar então a batidas de tambores marciais japoneses. Carmem vira uma espécie de fantasma maldito. E mostra sua opulência tirando de uma cesta vários colares preciosos, bananas de ouro, tamancos de brilhante, pandeiros com rubis... Vale a pena lembrar o balé executado por essa “Carmem-gueixa”. Ela dança de costas para o público, mas com uma máscara na nuca. A releitura japonesa, no fim, realmente fica bonita.

Eis que surge o malandro carioca, falando não o “carioquês”, mas o “fonemês” de Antunes – parecia russo ou algo assim. Infelizmente, para mim que estava curioso para apreciar o tão comentado trabalho de voz empregado por Antunes – segundo consta, as vozes de seus atores não saem diretamente pela boca, mas pela nuca, por ressonância –, o carioca disse pouco. Mas se fez compreender.

No final deste curto espetáculo (cerca de 40 minutos), as “Carmens” aparecem reunidas e dançam alegremente segurando cartazes de La Argentina , obra que Kazuo montou inspirado na dançarina espanhola Antonia Mêrce.

Resumindo, o que se viu foi uma salada de correntes artísticas. Kazuo cria o Butoh influenciado pela dança européia, principalmente a Ausdruckstanz, dança da expressão, fundada pela alemã de Mary Wigman (1886-1973), que influenciaria também a performer Pina Bausch. Ohno a assimila à tradição japonesa e o Butoh ( bu significa dança e toh quer dizer passo) nasce daí. Antunes, por sua vez, vai lá, pega o Butoh e mistura ao seu próprio método teatral. Quer dizer, é o legítimo samba do crioulo doido.

Confesso que saí um pouco decepcionado, mas, pelo que sei, o teatro do Antunes é construído de uma forma a qual não estamos acostumados. É um encenador muito místico, oriental, taoista, junguiano... Maluco, em suma. Por isso, acho que o seu teatro exige do espectador uma outra sensibilidade para a qual nem todos estão preparados. Ou talvez a encenação não fosse mesmo lá essas coisas. De qualquer maneira, Antunes estava pouco se lixando para quem não gostou da peça. Afinal, é um presente para o Kazuo Ohno e Carmem Miranda - e só para eles.

FONTE : http://www.rabisco.com.br/58/carmem_miranda.htm

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