Assange: Reconhecer como Prisioneiro de Consciência!!!
Carlos Alberto Lungarzo
Prof. Titular (r)
Univ. Estadual de Campinas, SP, Br
Prisioneiro de Consciência (POC, por seu acrônimo em inglês) é uma palavra definida no artigo Os Prisioneiros Esquecidos, de 1961,
escrito por Peter Berenson, o
fundador de Anistia Internacional. Esta expressão designa uma pessoa que é perseguida por suas crenças, sua ideologia,
sua visão de mundo, desde que suas posições tenham sido defendidas por
métodos não violentos.
Imagino que ninguém é capaz de dizer
que Julian Assange ou qualquer outro
membro de Wikileaks usou métodos violentos.
Wikileaks ganhou em abril de 2009 o
prêmio ao Novo Jornalismo de Anistia Internacional (New Media Award), por ter denunciado as execuções extrajudiciais
aplicadas em Kenya (Vide).
De fato, as principais ONGs de Direitos Humanos, especialmente as concernidas
com os problemas de Afeganistão, tinham uma relação de colaboração e
fraternidade com a “Wiki”.
Em seguida, quando o fundador da “Wiki”
começou a ser perseguido, Anistia emitiu um documento apoiando os direitos de
Assange à divulgação de material sigiloso.
Há pouco mais de um ano e meio
(dezembro de 2010), quando a perseguição contra Julian Paul Assange já estava andando
a toda máquina, Anistia Internacional publicou
uma declaração bastante detalhada sobre o caso do notável comunicador, que
apareceu na forma de Perguntas e Respostas num dos sites da instituição. (Veja aqui).
Nos meses transcorridos desde essa
data, a situação de Assange sofreu duas modificações: uma, previsível, foi a
negativa britânica a seu pedido de recusa de extradição a Suécia; outra,
recente, seu requerimento de asilo diplomático à República do Equador. Penso
que, sendo que a perseguição continua, a declaração de Anistia também continua tendo plena vigência.
Portanto, vou publicar textualmente
duas dessas perguntas com suas respostas. Todas as sete perguntas bem como a
recomendação de leituras posteriores que aparecem no comunicado original de
Anistia são importantes, mas o leitor pode lê-las no site indicado. Em caso de
dificuldades com o inglês, pode ser usada a tradução automática, que não é
muito mais fácil de ler que uma língua desconhecida.
P&R: Wikileaks e a Liberdade de Expressão
Publicado em 09 de dezembro de 2010
Íntegra das duas primeiras perguntas com suas respostas. Há
uma breve introdução de 621 caracteres, cujo conteúdo é conhecido por todos (fala
dos aspectos gerais da perseguição contra Assange) e, por tanto, será omitido.
Grifos e interpolações são meus.
Será que acusação de Julian Assange
para liberar documentos do governo dos EUA é uma violação do direito à
liberdade de expressão?
O governo dos
EUA informou em julho de 2010 que está conduzindo uma investigação legal sobre
as ações de Wikileaks e seu fundador, Julian Assange, sobre a distribuição
de documentos secretos. Várias
figuras políticas norte-americanas pediram um processo criminal contra Assange.
Segundo a Anistia Internacional, processos penais
cujo objetivo seja punir uma pessoa pelo fato de ter denunciado evidências
sobre violações dos Direitos Humanos nunca podem ser justificados.
O mesmo é
verdade no que diz respeito à informação sobre uma vasta gama de outros
assuntos de interesse público. No
mínimo, um número significativo de documentos divulgados pelo Wikileaks têm
denúncias deste tipo, de modo que qualquer acusação com base no todo ou em
parte desses documentos particulares, seria incompatível com a liberdade de
expressão.
Liberdade de
expressão é um direito humano reconhecido internacionalmente, que limita o
poder do Estado para proibir o recebimento e publicação de informações. [...]. Ainda não temos conhecimento de que qualquer
ação legal tenha sido tomada contra Julian Assange por causa de seu vazamento
dos documentos. Como tal, a
Anistia Internacional não está em posição de comentar sobre qualquer possível
caso contra ele especificamente [Isto foi dito em
12/2010].
Será que interferir com os
pagamentos a Wikileaks através de doação on-line constituem uma violação à
liberdade de expressão?
Na última
semana [refere-se a Dezembro de 2010] Paypal, Visa e Mastercard têm impedido
as doações a Wikileaks online, acusando
a organização de atividades ilegais. Tem
havido cogitação de que esta restrição foi devida à pressão do governo dos EEUU. Anistia Internacional não tem
informações para confirmar ou refutar essa afirmação, mas enfatiza que os governos
não podem evitar suas obrigações de respeitar o direito à liberdade de
expressão [usando procedimentos indiretos]. As empresas também devem, como mínimo,
respeitar os direitos humanos.
Fim da
Transcrição Textual do Comunicado da Anistia
As ONGs de direitos humanos têm apoiado a
tarefa de Wikileaks, exigindo apenas que Assange tivesse cuidado em manter
anônimos os nomes das fontes.
Entretanto, nos últimos tempos notamos certa
inércia dessas organizações na defesa ativa de Assange, possivelmente motivadas
não por falta de boa vontade, mas por uma visão um pouco ingênua das
instituições internacionais.
As OGNs de Direitos Humanos se ocupam de
combater a nível individual, de grupo e de governos, todos os atos que violem
esses direitos e as leis que protejam suas violações. As ONGs não propõem
(embora internamente aprovem) à modificação completa das estruturas sociais dos
países por ação política, embora impulsem medidas específicas para modificar a
legislação que não é eficiente na defesa humanitária.
Entretanto, acredito que exista um pressuposto
(muito provavelmente inconsciente) de que certos procedimentos jurídicos
que parecem cumprir com todas as garantias formais, devem ser considerados respeitáveis.
Não quero exagerar o que eu chamo “ingenuidade”,
pois muitas vezes as ONGs questionam julgamentos, mesmo que satisfaçam as
condições formais, quando as garantias não parecem suficientes para um
observador neutral.
As ONGs de DH denunciaram, por exemplo, os
julgamentos falsos da Itália nos anos 70 e 80, dos EEUU no caso de “terroristas”
e de pessoas de perseguidas por sua raça, da Alemanha no caso do grupo Baader
(isto implicou para o fundador de Anistia Internacional críticas dos fascistas
e dos americanos), e vários outros, apesar de que isso ia contra máfias
políticas que simulavam ser modelos de respeito jurídico.
Por ser colaborador externo desta organização,
conheço muito bem o cuidado da mesma nestas questões.
Entretanto, não se pode pensar que um julgamento é necessariamente limpo,
apenas porque cumpre todos os rituais puramente simbólicos do direito oficial. Não
devemos esquecer que, mesmo países com democracias que já foram exemplares
(como a Suécia), ou que são mais ou menos sofríveis, se comparadas com as dos
países americanos (como a britânica), obedecem a interesses concretos de
governos, corporações, grupos de pressão, e outros fatores espúrios.
Suécia possui uma tradição humanitária muito
forte, que não pode ser facilmente abalada
por um governo conservador. Ora, que seja difícil
abalar essa tradição, não significa que seja impossível. Por serem países
pequenos, os Escandinavos estão sujeitos à permanente pressão dos EEUU, e já os
políticos de grande honestidade, como foram Harald Edelstam e Olof Palme,
atualmente não possuem o poder que tiveram eles. As forças progressistas na
Escandinávia ainda são muitas, mas nelas predominam jovens que não conseguem
ser ouvidos pelos governantes conservadores, que se movem em função de
interesses e pressões.
Acabo de ler um artigo muito interessante num
blog, que veio a coincidir com o objetivo que eu tinha quando comecei a escrever
esta nota.
Por que Anistia Internacional
não decreta a condição de PRISIONEIRO DE CONSCIÊNCIA PARA Julian Paul Assange?
Fiquei muito entusiasmado por esta
coincidência e, portanto, recomendo vivamente a leitura deste artigo:
Também recomendo aos ativistas de Direitos Humanos uma
pressão cordial sobre Anistia para que adote Assange como preso de consciência
e, por sua vez, faça uma recomendação gentil ao presidente do Equador RAFAEL
CORREA DELGADO, para que conceda o asilo pedido por Julian.
Observe-se
que Assange é um prisioneiro
internacional e está nas mesmas condições que os milhares de presos de
consciência que Anistia tem adotado desde a criação dessa figura jurídica:
1.
Assange é acusado do “crime” de ter denunciado tortura,
genocídio e terror do estado dos EEUU
nos países que invade e massacra.
2.
O “crime” dele não é sequer político ou ideológico. É um supertípico caso de consciência. Impossível encontrar um
melhor exemplo de PRESO DE CONSCIENCIA.
3.
Ele está preso dentro da Embaixada de Equador, graças a
perseguição britânica, mediada pelos suecos, e deflagrada pelos EEUU. Sua
liberdade consiste no asilo.
4.
Quem pode soltá-lo é Rafael Correa, que tem demonstrado
sua honestidade e coragem na defesa de milhares de colombianos (se não me
engano, são mais de 34.000), perseguidos pela guerra interna que os americanos
desfecharam na Colômbia. Correa é um caso especial, um líder que, mesmo que
diga pertencer à esquerda cristã e ser nacionalista, atuou várias vezes como um
autêntico esquerdista. Mas ele precisa apoio, para garantir que, se ele
refugiar Assange, não será novamente invadido pelos EEUU, como em 2007, quando
os americanos mataram vários militantes enquanto dormiam em um acampamento.
Organizações que trabalham honestamente e não possuem
compromissos políticos não podem pensar que, sendo a Suécia um dos países mais
democráticos do mundo, apenas por isso garantirá um julgamento justo a Assange.
Isso é acreditar em fantasias kantianas.
Dianne
Feinstein, que, dentro dos EEUU, está longe de ser considerada “da
direita”, pediu o processo de Assange por traidor.
Isto foi indicado por vários comentaristas, inclusive americanos, como uma
atitude extremamente ridícula. Como um estrangeiro
pode ser traidor?
Mesmo se o conceito de traição tivesse sentido (muita
gente acredita ou finge acreditar que uma pessoa tem a obrigação de defender
seu país, pelo fato involuntário de ter nascido nele), ninguém pede lealdade de
um estrangeiro.
Aliás, Feinstein é uma influentíssima senadora da
Comissão de Segurança, que tem tanto poder real sobre a Comunidade de
informação como o Presidente. Se ela, considerada de centro, exige a cabeça de
Assange, já sabemos que a direita pede a pena de morte. Além disso, há outras
declarações oficiais. Já num plano não oficial, porém de alta probabilidade,
suspeita-se que a presidência esteja organizado um Grand Jury para processar o
fundador da Wiki.
·
Assange tem probabilidade baixa de ser julgado limpamente
na Suécia. Este país que, durante décadas de governos socialistas, orgulhou-se
de seu desprezo pela prepotência e brutalidade dos americanos, nos últimos seis
anos de governos conservadores já permitiu a extradição de algumas pessoas de
seu território aos EEUU.
Em
alguns casos, Suécia entendeu que tinha deturpado sua tradição e conseguiu a
devolução de dois dos extraditados, aos quais deu residência permanente. Mas
estas eram pessoas não representativas que os EEUU reclamaram apenas por
paranóia, e que posteriormente liberaram.
·
Já se fosse extraditado aos EEUU, Assange teria probabilidade
zero de um julgamento limpo. Esta é a primeira vez na história, que
um comunicador consegue criar um grave constrangimento às forças parafascistas
que, na prática, dominam os EEUU, embora não seja verdade que o vazamento tenha
colocado seu sistema belicista e imperial em risco.
Colocar na frente argumentos burocráticos (como esperar
que acabem os processos regulares para, depois disso e só então, intervir) é
brincar com a vida e a integridade física dos perseguidos. É louvável a
seriedade das ONGs de DH que dizem não ter informação exata sobre os
procedimentos americanos, que são mantidos em sigilo. Mas, o que não permite
dúvida, é que existe risco, e não se pode “apostar” como se fosse um jogo de póquer.
Aliás, deve perceber-se que a mídia comercial, embora não
se coloque frontalmente contra Assange, porque precisa manter seu mito de
defensores da liberdade, tenta, por todos os meios indiretos, denegrir sua
figura. Ter a mídia em contra é uma grande desvantagem, mesmo que se tenha a
favor grandes grupos de pessoas esclarecidas, e a mídia mais alternativa.
Equador e Assange devem ser
imediatamente apoiados, e o jornalista deve ser declarado imediato prisioneiro
de consciência.
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