No palanque das diretas, anunciado por Osmar Santos |
Ótima notícia é a alta de Socrates Brasileiro.
Parafraseando a inesquecível frase com que George Foreman esquivou-se de comparar os geniais Muhammad Ali e Joe Louis ("Não sei dizer se Ali foi o maior peso-pesado de todos os tempos, mas, sem dúvida, foi o melhor cidadão que já lutou boxe"), eu diria que o doutor foi o melhor cidadão que já se tornou grande futebolista.
Antes dele, os craques eram quase todos vaquinhas de presépio dos cartolas -- vis parasitas que vicejam à sombra das chuteiras imortais, para, da arte dos boleiros, extraírem grana, prestígio e poder.
Mesmo os que tinham espírito mais crítico e independente, evitavam dizer o que realmente pensavam da engrenagem mafiosa do futebol. Afonsinho, rara exceção, não teve a carreira que seu talento prefigurava, exatamente por haver ousado trombetear a nudez do rei.
O que Sócrates conseguiu foi impressionante: não só venceu como jogador (apesar do submundo do futebol e a venal imprensa caudatária terem insistentemente tentado desmoralizá-lo), como conseguiu unir o elenco do Corinthians em torno de suas idéias e impô-las aos dirigentes do clube.
Parabéns pelo novo gol, doutor! |
Lembrem-se: ainda estávamos sob ditadura. A democracia corinthiana (o direito de os atletas participarem da tomada de decisões que os afetavam, como a necessidade ou não de concentração antes dos jogos) servia como modelo e cartão de visitas da democracia em si. Havia um conteúdo político maior, subjacente à afirmação da dignidade profissional dos jogadores.
E, exatamente como Muhammad Ali, teve Sócrates a grandeza de dispor-se a um grande sacrifício pessoal em nome de suas convicções.
Ali perdeu o cinturão, muita grana e alguns dos melhores anos da carreira de um pugilista por recusar-se a servir como relações públicas para a agressão estadunidense ao povo vietnamita -- atitude que justificou com argumentos religiosos, mas cujo motivo maior ficou evidenciado na frase "Vietcong nenhum me chama de nigger [pejorativo muito usado pelos racistas dos EUA]".
Da mesma forma, Sócrates abriria mão de muita grana italiana se tivesse a oportunidade de contribuir para a reconstrução democrática do Brasil. Foi o que jurou num ato público da campanha das diretas-já, no Vale do Anhangabaú (SP): comprometeu-se solenemente a, caso fosse aprovada a emenda Dante de Oliveira, recusar a estratostérica proposta da Fiorentina.
Tenha vida longa, doutor. Ainda precisamos de você... e muito!
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