1) FABULA DE ANFION
(João Cabral de Melo Neto)
Escondendo a sua obsessão pela metalinguagem atrás de uma pseudo-fábula, João Cabral consegue na "Fábula de Anfion" sintetizar toda sua proposta poética.É nesse poema que encontramos a união perfeita entre o deserto(uma metáfora para a folha em branco) e a melodia (que representa todo o fazer poético em sua mais delicada perspectiva).
Definir Cabral é fácil: GÊNIO
"Diz a mitologia
(arejadas salas, de
nítidos enigmas
povoadas, mariscos
ou simples nozes
cuja noite guardava
à luz e ao ar livre
persiste, sem se dissolver)
diz, do aéreo
parto daquele milagre:
Quando a flauta soou
um tempo se desdobrou
do tempo, como uma caixa
de dentro de outra caixa."
2)TABACARIA
(Álvaro de Campos)
Fernando Pessoa definitivamente é um caso a parte. Toda a sua vasta
produção poética, incluindo a de seus heterônimos, mantém uma
qualidade vista pouquíssimas vezes na literatura.
Muitos de seus poemas poderiam estar aqui, escolhi esse porque desde
a primeira vez que o li achei de uma genialidade espantosa.
Confesso que foi o mais difícil, pois selecionar apenas alguns versos
dele é ser injusto com a beleza de todos os outros. Uma obra prima do
começo ao fim.
"Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime."
3) CAMPOS DE FLORES
(Carlos Drummond de Andrade)
Dizem os boatos que Drummond escreveu esse poema para sua amante. Faz sentido, visto seus últimos versos. Escolher uma estrofe desse foi dificílimo também, ele é altamente inspirado do começo ao fim.
Apesar de ter ficado em terceiro, leva o um outro título: O mais belo poema
de amor já escrito em Língua portuguesa.
"E o tempo que levou uma rosa indecisa
a tirar sua cor dessas chamas extintas
era o tempo mais justo. Era tempo de terra.
Onde não há jardim, as flores nascem de um
secreto investimento em formas improváveis."
4) (Paulo Henriques Britto)
Se hoje em dia sou leitora e admiradora da poesia de Paulo Henriques Britto, devo isso a esse poema.
Ele foi o primeiro dele que li, antes mesmo de conhecer o autor e, desde essa
primeira leitura, me impressiona a aparentes simplicidade que esconde na verdade uma intricada construção metafórica.
Tenho uma impressão parecida com a que tenho quando leio Rubem Fonseca: a linguagem parece simples, mas quando se observa atentamente nota-se que é uma simplicidade mais poética do que qualquer rebuscamento.
"Que ninguém nos ouça: guarda esse escafandro, meu filho. Só o raso é cool. A dor é Kitsch."
5) VOZES D'ÁFRICA
(Castro Alves)
Só a brilhante escolha de colocar o próprio continente africano como eulírico nessa poesia já valeria seu lugar nessa lista. Mas Castro Alves fez mais: construiu um belo poema, denunciando os horrores da escravidão e criticando a sociedade da época. Tudo isso sem perder o lirismo. Nem só de modernistas e contemporâneos vive a poesia...
"Basta, Senhor! De teu potente braço
Role através dos astros e do espaço
Perdão p'ra os crimes meus!
Há dois mil anos... eu soluço um grito...
Escuta o brado meu lá do infinito...
Meu Deus! Senhor, meu Deus!..."
*POSTADO POR ZARATUSTRA
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