quinta-feira, 18 de setembro de 2014

O MAESTRO E A FILARMÔNICA DE VIENA - Por Jackson Machado de Assis e do Pandeiro.



Sinceramente, havia momentos, a meu ver, que ele juntava entre as mãos,
todo o som que vinha da grande orquestra. Para, depois, sorrir, como que
dizendo que naquele punhado de notas que, agora, espalhava pelo ar,
estava, exatamente, o que havia pensado, ou imaginado. Como se tudo
fosse o que ele esperava daqueles músicos; aparentemente, sem a mesma
projeção de um dirigente de orquestra, mas, cada um, com a sua
contribuição importantíssima, pessoal, seja qual fosse o instrumento.
Interessante, também, era quando alguns, ou pequenos grupos tocavam
alguma parte – como se fossem muitas – davam a impressão, embora se
ouvissem tantos outros, de que estavam sozinhos; tocando aos seus bels
prazeres. Nada, tinha um monte deles, de outros naipes, a sustentar aquela
linda emissão de sons. Acho que era o acompanhamento. Sei lá, não sei
como é que isso funciona. No comecinho, juro, fiquei com medo.
Apreensivo pelo sujeito que, parecia, tocava sozinho uma flauta.
Acompanhamento (ou solo, sei lá) somente uma caixa que, teimosamente,
repetia os compassos iniciais, do jeito que havia começado. Pior, assim foi
por toda a apresentação, entravam e saiam instrumentos; em certos
momentos até a orquestra inteira. E ele lá, impassível, repetindo aqueles
primeiros compassos, do mesmo jeito que havia começado. Pensei: Será
que é assim, mesmo? Outros sopros iam-se revezando. Depois, com o
avançar da música, juntavam-se, em plena solidariedade. Cada vez mais
alto. Eu já estava achando a participação das tais cordas – violinos, violas,
celos, contrabaixos – e outros, muito contida. Será que iriam ganhar a
mesma coisa? Só faziam pim, pim, pam, pam, com as pontinhas dos dedos.
Pra ser honesto, tinha lá o seu efeito. Os sopros não paravam de entrar.
Acho que uns ajudavam aos outros. Até uma harpa, fazendo, o mesmo que
outras cordas, pam, pam, com a pontinha dos dedos. Sabem aquele cara da

caixa que falei antes? Continuava, na mesma tecla. Repetia, de forma
acintosa, cada vez mais alto, aqueles benditos primeiros compassos. Apesar
daquele monte de instrumentos, mais os respectivos acompanhamentos, a
intensidade aumentava, mas, a música, parecia sempre igual. Já beirava os
quinze minutos. Aí, sim, me caiu o queixo, As tais cordas, atacaram, pra
valer. Agora, sim, fariam jus ao cachê. Mas a música, sensação estranha,
patinava e andava e, ainda por cima ficava mais alta. O maestro, a bem da
verdade, pra mim, não estava mais regendo. Fazia lá uns trejeitos; abria os
braços; usava o dedo indicador da mão esquerda como se fora uma segunda
batuta, apontando ora para uns e ora para outros músicos. Sempre com cara
de satisfeito. Certamente os músicos ainda estavam correspondendo aos
seus anseios. Acho que alguns que estavam na plateia pensaram que nem
eu: Afinal, esse tabladinho aí é pra reger ou pra dançar! Deixei pra lá. Cada
um com o seu cada um. Como todo maestro, chegando ao fim, escabelava-
se. Tinha um cara, acho que era um trombone, assim, como se estivesse no
quintal da casa dele. Tocando como bem entendia. E como entendia! E a
música patinando e andando. Que sensação estranha. No final,
sinceramente, não entendi. Achei que tinham desafinado. Mas, todo mundo
aplaudiu. Sinal de que era assim, mesmo. O Boléro de Ravel, com a
Orquestra Filarmônica de Viena, sob a batuta do venezuelano Gustavo
Dudamel, ê turminha danada, sô!



Jackson Machado de Assis e do Pandeiro
(publicado hoje no Jornal Pé no Saco)








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