quarta-feira, 18 de abril de 2012

BREIVIK, MUITO DIFERENTE?




Breivik: Muito Diferente?
Carlos A. Lungarzo
Quando se lê a brutal franqueza do ex-matador em série da Noruega, sente-se um arrepio. Há pessoas como estas, que conseguem assassinar massivamente e sentir-se orgulhosos por isso? Ele admite todas as acusações e ainda se gaba de seus atos, dizendo que não são crimes. Para ele, crimes são os do governo trabalhista, que enche o país de pessoas “inferiores”, faz o jogo do “multiculturalismo”, e não percebe que há RAÇAS e “raças”.
Não é por acaso, acredito, que o crime de Breivik não tenha causado muita impressão nos países latinos, tanto nos da América Latina, como em alguns da Europa, por exemplo, a Itália, enquanto em países com tradição democrática, começando pelos escandinavos, o caso preocupou a todos.
No dia seguinte ao do atentado (23 de junho), o deputado italiano Mario Borghezio, líder da católica Liga do Norte, elogiou o sniper e disse que as ótimas idéias do atirador eram a resposta natural ao multiculturalismo (Vide). Milhares de neonazistas de vários lugares do mundo vibraram, pensando que aparecia um messias, alguém que tinha a coragem de se gabar de seu espírito genocida na frente das autoridades de um dos mais civilizados países do planeta.
Afinal, qual é a verdadeira diferença entre Anders Breivik e muitos seres humanos comuns, que encontramos em nosso dia-a-dia?
Os que vivemos nestes enclaves do mundo (como a América do Sul), que receberam de braços abertos legiões de fascistas europeus para que continuassem a tarefa de depredação e extermínio começadas pela espada e a cruz luso-hispânicas, não temos muito motivo de espanto.
Qual é a diferença entre Breivik e a classe média branca, cristã e européia do Sudeste Brasileiro, que cuida com exemplar capricho que seus filhos não se misturem com negros e nordestinos?
Qual é a diferença entre a juíza que condenou a morrer trás as barras (não outra coisa significa a prisão no Brasil) um jovem mulato e marginado, que atirou contra sua namorada. Isso aconteceu quando a polícia entrou bruscamente no quarto em que ele a mantinha cativa, sabendo, graças aos delicados treinamentos da SWAT, que a surpresa e o medo iam deflagrar os reflexos do dedo no gatilho?
A diferença é que aquela patricinha apenas vitimou um, e não 77. Mas, ela está no começo de sua carreira e já haverá outros em seu caminho. A principal diferença é que a juíza, os policiais, os militares e outros similares se protegem com a lei, enquanto Breivik desafia a lei. Mas, nem por isso Breivik é melhor. A coragem violenta não é, na minha opinião, uma virtude.
E Pinheirinho, então? Que saibamos concretamente, houve apenas uma criança morta, mas poucos duvidam seriamente que há outros. Mas, mesmo se o estado não ocultasse os resultados, é difícil que os mortos cheguem a 77. Todo estava calculado para uma vingança “moderada”.
Isso, porém, não é problema. Há milhares de favelas no Brasil onde os “caveirões” entram cuspindo fogo. Afinal, todos, crianças, mulheres grávidas, nenês de berço, todos são traficantes.
E que dizer então das redes de varejo que gratificam generosamente à polícia para que “limpe” seus bairros? Quem não ouviu falar de magnatas que se deslocam em seus carrões múltiplos (todos eles iguais, para não serem identificados) e cuja guarda pratica tiro ao alvo nos meninos que esmolam nas ruas? Quem não lembra o caso de Praça da Sé, enterrado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em tal mistério que nem a própria OEA consegue se fazer obedecer? Quem não ouviu falar de Carandiru, de El Dorado, de Vigário Geral, de Candelária e de outras centenas ou milhares?
Breivik é mais um terrorista místico: como o albino Silas do Código da Vinci, igual que os snipers da PM brasileira, como os filhos de dignitários e magistrados que queimam índios vivos, estupram meninas, lincham nordestinos, atropelam trabalhadores dirigindo bêbados, como o triste caso do filho de um ministro em 1996. Tudo isso é feito sem alvoroço nem julgamentos. Eles a têm benção de magistrados e a solidariedade compassiva dos politiqueiros, lamentando que aqueles meninos “bem nascidos” vejam seus nomes poluídos apenas porque mataram alguns garotos negros, índios e pobres, para livrar-se, com toda razão,  do cruel tédio das raças superiores.
Isso, para não falar de nossos múltiplos torturadores e genocidas que o governo democrático protege sob uma farsesca Comissão de Memória, e que o STF encobre sobre a Lei de Anistia.
Livros e filmes como Tropa de Elite que representaram o Brasil em diversos festivais e mereceram parabéns do estado, estão cheios de Breiviks. A diferença ética, se existe, é a favor do terrorista norueguês. Mas a principal diferença é psicológica. Nossos matadores oficiais se protegem na lei, se reúnem em dúzias para matar um par de traficantes, aplicam torturas para que seu inimigo sofra o máximo. São, além de sádicos, covardes.
Anders Behring desafia a lei, chamando-a de ridícula, encara ele sozinho centenas de pessoas e não aplicou tortura. Diz que aceitaria a penas de morte e que só queria “limpar” a sociedade.
Embora diga não ser nazista, ele atua como um nazista. Já nossos terroristas místicos são inquisidores medievais, sádicos, ansiosos de um “porre” de sangue, padecem de síndrome de abstinência de pólvora. Não é por acaso, acredito, que a mídia brasileira se ocupa pouco deste caso que, inversamente, causa estupor na Europa: Breivik, traduzido ao português, é um velho conhecido nosso. Ninguém, então, precisa dedicar a ele muito espaço.
Anders Behring Breivik confessa ser um militante cristão, mas não um fundamentalista. Ele apenas quer salvar Europa da descristianização. Mas, tem pouca chance de sucesso, e não é por causa dos muçulmanos. Nos países mais esclarecidos do Velho Continente, numerosas igrejas são transformadas em museus e escolas, porque têm perdido seus fiéis. Mais de 60% do norte de Europa está formado por partes quase iguais, de espiritualistas e de agnósticos, e menos de um 30% segue religiões institucionais.
Isto é um indicador que os homens como Brevik não se multiplicarão, porque não há genocídio na história humana (incluindo os de Stalin) que não esteja amparado por uma mística, mesmo que essa mística pareça ateia, como o maoísmo-stalinismo.
Apenas nestes tristes trópicos, resíduo de bárbara colonização hispânica, ainda florescem teologias de uma suposta libertação, e talvez seja por isso que milhares de nazistas encontraram proteção no Brasil, na Bolívia, no Paraguai e, sobretudo, na Argentina. Por isso também é Cáritas e não um órgão secular que administra a seu prazer o escasso refúgio que se outorga a verdadeiros perseguidos.
Em fim: Breivik talvez seja apenas um aprendiz comparado com estes personagens no qual nossa América Latina é tão rica. Seu pior defeito é seu alarde, que pode estimular outros fanáticos como ele para sumir no pânico uma sociedade como a Noruega, que, se dissolvesse seu exército e se afastasse da NATO, seria quase uma sociedade perfeita.
Mas, é provável que este ódio racista possa ser controlado. Porque a sociedade norueguesa não quer combater o terror ilegal com o terror policial. O Primeiro Ministro norueguês, Jens Stoltenberg, perguntado sobre como vai combater a onda de violência disse: com mais democracia.
Por sinal, na Noruega governa também, como no Brasil, o Partido dos Trabalhadores (Arbeidarpartiet), ou, para sermos mais exatos, um partido cujo nome, traduzido ao português é o mesmo do PT.

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