A vitória de Marina – pois foi uma grande vitória – deixou os dois que obtiveram mais votos no 1º turno – Dilma e Serra – como reféns das propostas de Marina e do Partido Verde, na esperança de herdarem os mais de 20 milhões de votos dados à senadora.
Fácil seria para Marina liberar os seus correligionários para votarem em quem quiserem, de acordo com as suas consciências, mas isso tiraria toda a força da vitória alcançada do que ela mesma diz que é uma nova maneira de ver e de fazer política neste país. Se ela agir assim, as razões da sua candidatura e da sua luta até agora se diluiriam rapidamente e aqueles que nela votaram se sentiriam, novamente, órfãos da pátria mãe que tem sido tão pouco gentil com os seus filhos abandonados. Além disso, os que acreditaram em Marina e nela votaram, estes sim se sentiriam reféns da velha política de cooptação das coligações lideradas por PT e PSDB.
Em um Brasil que elegeu Tiririca, numa clara demonstração de deboche ante as esfarrapadas instituições do sistema - que primam pela corrupção - propostas como educação, desenvolvimento sustentável, construir sem destruir, consumir sem ser consumido, cuidar bem da nossa água, das florestas e das cidades, acabar com o desperdício na produção de alimentos, de energia na construção civil, no uso dos recursos públicos em todos os outros setores – tendo como alicerces a educação e a inovação – despertaram as pessoas daquele marasmo que estas eleições estavam provocando em grande parte da população.
Um marasmo devido à polarização do processo eleitoral entre dois grupos partidários que nada apresentam de novo e que trazem em si o germe do retrocesso político; com uma proposta de economia neoliberal, visando um desenvolvimento desregrado que tem como único objetivo a acumulação dos bens de capital, dos lucros gerados pelas riquezas do nosso país destinados aos bancos e às grandes empresas, deixando sempre o povo de lado. Povo que recebe as migalhas dos programas assistenciais e se rejubila quando as recebe. Um povo que já está se acostumando a ser idiotizado pelos meios de comunicação e a estender a mão para os poderosos, como se isso fosse muito natural e que desconhece a sua força que somente é lembrada em época de eleições.
Em um momento como este, de quase total abulia, de desmembramento das forças sociais, apesar de algumas tentativas partidárias esparsas - notadamente da esquerda socialista que ainda não encontrou o seu rumo, dividida em vertentes que se negam a formar um caudal, ou buscar a sua origem, a sua fonte primária – uma proposta mínima de participação social concreta, visando objetivos claros, pontuais, como a preservação da natureza, através de grupos sociais civis, tendo como base a educação e como objetivo final a busca da construção de um país novo e à frente uma pessoa corajosa e decidida, como Marina, despertou naqueles vinte milhões de pessoas a possibilidade, ainda que remota, de um voto que valesse a pena – uma espécie de resgate do voto do povo.
E ocorreu o inusitado. A candidata do governo e o candidato da oposição foram para o 2º turno graças aos votos recebidos por Marina, e não por seus próprios esforços. Principalmente Serra, que deve estar agradecendo de mãos postas a ineficácia de Dilma e do PT no último mês de campanha e ao crescimento avassalador de Marina.
Dilma tende a cair mais, mas não o suficiente para perder, e Serra deverá conquistar mais um ou dois pontos percentuais – o que não será suficiente para ganhar. É aí que entram os votos de Marina. Vinte milhões de votos. Um quinto do total dos votos válidos.
Fazer composição seria fácil se Marina apenas buscasse o poder pelo poder. Bastaria a oferta de ministérios, secretarias, algum poder dentro do Poder e estaria tudo certo. Aparentemente.
Mas não acredito que seja essa a idéia de Marina – voltar a participar do Poder entrando pela porta dos fundos e aceitando a sua fatia em troca dos votos recebidos no 1º turno. Mesmo porque foram votos espontâneos, que despertaram parte do povo ainda consciente de sua força para a possibilidade de um Brasil novo, longe das políticas sujas a que estamos acostumados. Foram votos de esperança, de um novo tipo de esperança, e que não podem, simplesmente, serem jogados no lixo do esquecimento.
O Partido Verde, enquanto partido político, não tem a força que Marina possui: de congregar as pessoas. É um partido instável, que carece de ideologia e que aproveita a onda verde do momento apocalíptico que passa a mãe terra. Por si mesmo, o PV não tem como barganhar nem um voto. Mas Marina tem essa força. Aqueles que votaram em Marina acreditarão nela no instante em que ela apontar um dos dois candidatos - Dilma ou Serra – como sendo aquele que cumprirá, pelo menos em parte, os objetivos a que ela se propôs, caso fosse eleita.
E para que isso aconteça, para que os votos de Marina revertam para o PSDB ou para o PT será necessário que um dos dois partidos assuma um compromisso público com o desenvolvimento sustentável, capaz de suprir as necessidades das futuras gerações, sem esgotar agora os recursos para o futuro, promovendo a revisão de políticas públicas que são predadoras em relação ao homem e à natureza.
Não acredito que o PT faça isso, porque está demasiadamente atrelado ao capital internacional e ao grande latifúndio nacional, cedendo cada vez mais terras para desmatamento, promovendo a destruição da Mata Atlântica e, o que é mais visível e criminoso, prestes a construir a Usina hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu, no estado do Pará – o que irá desalojar milhares de pessoas e causar imenso impacto ambiental. Além disso, o PT acredita que com apenas mais três ou quatro pontos percentuais Dilma vencerá a eleição. Dilma, que tem um profundo desagrado por Marina, que a colocou em xeque.
Resta o PSDB. Poderia o PSDB de Serra dar alguns passos atrás na sua política conservadora e centrista, que pouco se diferencia da política do PT? Poderia Serra prestar um compromisso inviolável de promover o desenvolvimento sustentável, através de políticas públicas ligadas ao meio ambiente e à defesa da natureza? Poderia o PSDB, e Serra, comprometer-se a combater seriamente o desmatamento, a diminuir as áreas de cultivo de transgênicos, a impulsionar uma política nacional de defesa do meio ambiente e, o que é mais importante neste momento, evitar a construção de Belo Monte?
Até que ponto os grandes partidos brasileiros, apoiados em grandes coligações e interesses econômicos, são confiáveis em suas promessas?
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