Durante a república romana, em 73 a. C. quando Júlio César recentemente tinha sido eleito Pontifex Maximus (sacerdote supremo) ocorreu em sua casa uma festa ao deus Baco, reservada somente às mulheres. O jovem Publius Clodius, apaixonado por Pompéia, mulher de César, conseguiu penetrar na festa vestindo-se de mulher, mas foi descoberto pela mãe de Pompéia. Publius Clodius foi acusado de sacrilégio, julgado e absolvido, mas Júlio César divorciou-se de Pompéia. Perguntado pelos senadores porque tinha se divorciado, se não ficara provado o adultério, César respondeu com a célebre frase: “Não basta que a mulher de César seja inocente, ela tem que parecer inocente”.
Muitas tem sido as interpretações dessa frase de Júlio César, principalmente o papel que diz respeito aos governantes. Mas devemos ater-nos à época. César era o Pontifex Maximus de Roma, título que significava O Sacerdote supremo do Colégio dos Sacerdotes, a mais alta dignidade romana. Literalmente, significava “Máximo” ou “Supremo” construtor de pontes. Simbolicamente, significava que o Pontifex seria o construtor das pontes entre os deuses e os homens. Também poderia ser interpretado como o preparador da estrada, porque a palavra pont em etrusco significa estrada, sendo a palavra romana uma distorção da palavra etrusca.
A residência oficial do Pontifex Maximus era a Domus Publica, situada entre a Casa das Virgens Vestais e a Via Sacra. O Pontifex Maximus usava as vestes brancas (daí a expressão vestal, que significa pureza e refere-se ao culto à deusa Vesta – que simbolizava a perenidade do Estado), o anel e o báculo, quando de cerimônias importantes do seu cargo.
Foi na Domus Publica, casa do Pontifex Maximus – Julio César – que se realizou a cerimônia a Baco, que era restrita somente às mulheres, na ocasião em que Clodius foi preso e acusado, justamente, de sacrilégio. O fato de ele, Clodius, estar apaixonado por Pompéia Sula, mulher de César – motivador da sua invasão, disfarçado de mulher – foi secundário. Clodius foi absolvido porque era de uma família patrícia, jovem demais e porque tinha sido descoberto a tempo, antes da realização dos mistérios principais da cerimônia a Baco.
Acredito que a atitude de César, divorciando-se de Pompéia, foi perfeita. Ele, como Pontifex Maximus, não poderia continuar casado com uma mulher sobre a qual pairasse a menor suspeita.
Atualmente, a frase de César é usada no sentido de honradez, sempre que um governante é suspeito de alguma atitude ilícita. Mas, principalmente no Brasil, percebe-se muita pouca honra entre os governantes. E, por exemplo, um Presidente da República ou um(a) aspirante ao mesmo cargo dificilmente poderia, em sã consciência e com a mente pura, vestir as vestes brancas.
Tivemos um único caso em que um Presidente brasileiro – Getúlio Vargas - preferiu o suicídio a deixar a sua honra ser maculada. Mas eram outros tempos, outra geração e tratava-se de uma pessoa ímpar na História brasileira.
Observem os fatos de agora, vésperas das eleições presidenciais do segundo turno.
Erenice Guerra, bacharel em Direito, Ministro-chefe da Casa Civil entre abril e setembro de 2010. Pediu demissão do cargo pelo seu envolvimento no escândalo dos cartões corporativos.
Mas não se limita a isso. Segundo as últimas notícias, o seu filho, Israel Guerra, participou de um esquema de tráfico de influência, com cobrança de propinas e tudo o mais. No mesmo escândalo estão envolvidos mais um irmão e uma irmã de Erenice, por contratos sem licitação.
Poderia ficar somente na família de Erenice, não fosse o fato de ela ser auxiliar direta de Dilma Roussef durante a pré campanha da candidata. Mais que isso. Além da família de Erenice também está envolvido no mesmo escândalo Márcio Luiz Silva, que integra a coordenação jurídica da campanha de Dilma Roussef.
Agora, aparece o nome do jornalista Amaury Ribeiro Júnior, apontado pela Polícia Federal como o responsável por encomendar a quebra de sigilo fiscal de pessoas ligados ao candidato oposicionista José Serra. E tudo aponta para Dilma Roussef, que nega tudo – é claro.
Mas a informação mais recente é o indiciamento do próprio Partido dos Tabalhadores e de Gilberto Carvalho, assessor do gabinete do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
O assessor e o PT viraram réus num processo em que são acusados de participarem de uma quadrilha que cobrava propina de empresas de transporte na prefeitura de Santo André para desviar R$ 5,3 milhões dos cofres públicos. O esquema é o precursor do mensalão do governo petista em Brasília.
Conforme o site br.eleições - http://br.eleicoes.yahoo.net/noticias/4457/chefe-de-gabinete-de-lula-vira-r-u-em-caso-de-corrup-o.html - literalmente:
“A decisão judicial em acatar a denúncia foi celebrada ontem pelos promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) da região do ABC, responsáveis pela investigação. "Ao receber a denúncia, a Justiça reconhece que há indícios para que a ação corra de verdade. É um caminho importante para resgatarmos o dinheiro desviado", disse ao jornal O Estado de S.Paulo a promotora Eliana Vendramini. Ela destaca que a Justiça decidiu aceitar a denúncia depois de ouvir a defesa de todos os acusados nos últimos três anos.
“De acordo com a ação, o assessor de Lula transportava a propina para o comando do PT quando era secretário de governo do então prefeito de Santo André, Celso Daniel, assassinado em janeiro de 2002. "Ele concorreu de qualquer maneira para a prática dos atos de improbidade administrativa na medida em que transportava o dinheiro (propina) arrecadado em Santo André para o Partido dos Trabalhadores", diz a denúncia aceita pela Justiça. Segundo a investigação, os recursos eram entregues ao então presidente do PT, José Dirceu.”
E há quem se pergunte: “Mas o Lula não renuncia?” “O Governo não cai?”.
Não. Nem o Lula renuncia nem o governo cai, nem a Dilma aceita que todos aqueles indiciados no caso dos cartões corporativos e da quebra do sigilo fiscal dos adversários políticos tenham alguma relação com ela.
Ela e o Lula são inocentes. Os outros é que poderão ser culpados. Talvez.
Também não é uma notícia que saia na Globo. No máximo, uma ou duas linhas, sem nenhuma ênfase, no caso de muitas evidências. Por que a Globo? Porque a Globo é o próprio Sistema.
A GLOBO E O PT
Outros tempos. Lembro quando a Globo quis tirar o Collor: foi questão de dias. Inclusive, o Collor foi absolvido depois. Mas já estava fora do poder, depois de renunciar e, no dia seguinte ser votado o seu impeachment. E, no entanto, as provas eram fracas, insuficientes.
Agora, sobejam. Mas qual o interesse de uma grande rede de comunicação em revelar as sujeiras de um governo que lhe é fiel?
Os militantes do PT até hoje atacam a Globo, mas deve ser por vício ou por ofício.
Quando Lily Marinho, viúva de Roberto Marinho, das Organizações Globo, recebeu Dilma Roussef, no início do ano, ficou muito encantada.
A Folha de São Paulo relata:
“Dilma se sentou perto de Lily, em cadeira de rodas por causa de uma queda. "Que tipo de música você gosta?", perguntou a anfitriã. "Clássica. Gosto de Bach", respondeu a candidata. "Ela toca piano e fala francês", revelou uma amiga de ambas a Lily. "Eu tinha curiosidade de conhecê-la", explicava Lily.
“Não, repetia, ela não vai oferecer almoço a José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV), adversários de Dilma na campanha presidencial. "Eu não sou política. Se ficarem com ciúmes, o que posso fazer? Nada."
“Aos poucos, o quorum aumentou. "A Lily estava um pouco ansiosa porque muitas têm até medo de chegar perto do PT e da Dilma. Mas todo mundo está chegando, graças a Deus", dizia uma amiga da anfitriã.
“Na hora do almoço, Dilma e Lily dividiram a mesa com a economista Maria da Conceição Tavares, a escritora Nélida Piñon, a produtora Lucy Barreto e a colunista Hildegard Angel, entre outras.
“A conversa girou em torno de amenidades. "Todos os candidatos homens já fizeram plástica. To-dos", dizia Dilma. E as pesquisas eleitorais? "Deixa eu ficar no empate [com Serra] que tá bom", respondeu a petista. No cardápio, tartare de salmão com maçã e funcho e filé de cherne com banana caramelada, passas e urucum do chef Claude Troisgros.
“Antes da sobremesa, Lily leu um rápido discurso. Disse que ofereceu o almoço para homenagear "a senhora D, a senhora democracia".
“E que seria um privilégio ouvir "a outra senhora D, Dilma Rousseff, que se propõe a ser a primeira mulher presidente do Brasil".
“Dilma fez um discurso sob medida. Falou de educação, família e cultura -e das "lutas de milhares de brasileiras anônimas". "Eu acho que chegou a nossa hora!" Cantarolou com Alcione ao microfone -e se despediu de Lily: "Te espero na minha posse".”
Nada de mais. O PT já namora com a Globo há muito tempo.
Claudio Julio Tognoli, desvenda em sua matéria A NOVA ESTRELA alguns detalhes desse namoro:
“A Globo "lulou" ao osso porque vai precisar da ajuda do presidente para contornar a sua caleidoscópica situação financeira. E, para sustentar essa resposta, nossa fonte de consulta é uma dissertação de mestrado defendida há dois meses na Escola de Comunicações e Artes da USP: chama-se A Média da Mídia, e o autor é o veterano repórter João Wady Cury, orientado pelo professor-doutor Carlos Marcos Avighi.”
“Diz a dissertação de João Wady Cury que o balanço consolidado da Globopar no ano de 1998, além dessas informações, registra ainda o endividamento das empresas que formam a Globo Comunicações e Participações S/A: cerca de 3,5 bilhões de dólares, de acordo com o levantamento realizado e assinado pelos técnicos da Ernest & Young Auditores Independentes S/C. Suas principais dívidas, refere o trabalho de Cury, são decorrentes de emissão de eurobônus, commercial papers e empréstimos adquiridos junto a seus principais credores. A curto e longo prazo, seus credores são os bancos internacionais e o montante da dívida, contraída em moeda estrangeira, é de aproximadamente US$ 2,9 bilhões. Estão nesse grupo de credores o Bank of Boston, Banco Sumitomo, o Banco Mitsubishi, o Banco BBA Creditanstalt S/A, o Banco Sogeral S/A, o Unibanco e o Banco de Tokyo.
“Agora sai também da dissertação de Wady Cury o argumento que habilitaria tecnicamente a resposta segundo a qual é instrumentalizado o "lulismo" da Globo: para instituições financeiras brasileiras, a dívida em reais soma 616,7 milhões de dólares e seu principal credor é o governo brasileiro, por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), cujo montante em 1998 era de 148,7 milhões de dólares.”
Ainda, como fonte, o site Mídia Independente:
“Se em 1987 e em 1989 (como se vê no excelente documentário "Além do Cidadão Kane", disponibilizado na página da Central de Midia Independente) Lula criticava severamente a parcialidade e cegueira da Rede Globo de Telealienação, a emissora, sempre áulica, hoje defende os pontos de vista do PT, sempre contra o povo brasileiro.
“Há algum tempo, o "Jornal da Globo", que passa tarde da noite e é apresentado normalmente pela Ana Paula Padrão, gozava de alguma credibilidade. Fatos recentes excluem totalmente esta pífia credibilidade...
“Quando o noticiário nacional, em todas as outras emissoras de TV, Rádio e Jornais informavam dos problemas envolvendo a remessa escusa de divisas pelo presidente do Banco Central, assim como pelo presidente do Banco do Brasil, além de informar que o presidente do Banco Central sonegou imposto de renda e cometeu falsidade ideológica junto à Justiça Eleitoral, enquanto o presidente Kasseb, do Banco do Brasil, desviava recursos do Banco para a aquisição de uma monumental e suntuária sede para o PT, o "Jornal da Globo", na voz de Ana Paula Padrão "anunciava": "a economia finalmente atingiu a retomada do crescimento!" ou "jacaré dá luz a filhote no zoológico de Recife", ou ainda "Lula vibra com o filme Pelé Eterno!"
“A Globo é assim: quando interessa - tem dívidas monumentais com o BNDES e não pode contrariar o governo, qualquer governo - nada de manchetes, nada de noticiário, muita auto-referência - fala-se dos atores de novelas no Faustão, fala-se de novos grupos desconhecidos de rock ou pagode, mas nada que interesse para informar a população quanto ao que de fato está acontecendo no Brasil.
“Apenas para relembrar, durante a ditadura militar, a TV Globo foi adesista de primeira hora, sempre contra o povo brasileiro e sua censura interna sempre foi tão rigorosa que deixava atônitos os censores da ditadura!"
Em 6 de setembro de 1987, Lula, então deputado federal, disse o seguinte: "Nós hoje somos um país com praticamente 20 milhões de crianças abandonadas. Somos um país com 16 milhões de analfabetos. Somos um país onde a história é contada pela Rede Globo de Televisão porque o senhor Roberto Marinho não faz outra coisa a não ser mentir para o povo”.
Quando Roberto Marinho faleceu o presidente Lula disse: “"um homem que veio ao mundo para prestar serviços à comunicação, à educação e ao futuro do Brasil".
Atualmente, a Globo, o PT, Lula e Dilma estão do mesmo lado. Sem a Globo, Dilma não se elegeria. As pesquisas de opinião mostrariam uma grande queda em sua popularidade e as pessoas seriam influenciadas pelas pesquisas. Outros expedientes seriam usados e Dilma não teria a mínima chance. Com a Globo, até o palhaço Tiririca pode ser eleito Presidente. Infelizmente, este é um país de analfabetos, e é importante para o Sistema que continue assim.
Com tantos escândalos envolvendo PT, Lula, Dilma e assessores diretos e não esperando que nenhum deles venha a renunciar a seus cargos ou aspirações, ou que o PT se desfaça, enojado de si mesmo, porque não há honra naquele meio, o caso da mulher de César fica sendo apenas um exemplo muito antigo.
Já o caso de Getúlio Vargas é bem menos antigo, foi nos anos ’50. Mas ele era uma pessoa honrada.
As pessoas, o grande público, a massa tão facilmente moldável por meios de comunicação como a Globo e aderindo facilmente às ideias que esses meios professam, já estão se acostumando com os escândalos e com a amoralidade na política. Não porque seja uma qualidade da política o escândalo, o roubo, a possibilidade de assassinato. Mas porque não há punição para quem usa dessas práticas. No máximo, processos que serão arquivados, ao final. E todos sabem disso. Os três poderes estão muito entrelaçados.
O Brasil está ficando, cada vez mais, um país ridículo. As pessoas riem dos seus governantes e representantes, riem das leis, riem de si mesmas.
Não tem nada a ver com a Roma Antiga. Com certeza.
Fausto Brignol.