sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

VIA WHATSAPP - DOIS TEXTOS SOBRE TUITI


A Paraíso do Tuiuti ganhou o prêmio Tamborim de Ouro 2018.

Texto: Luiz Guilherme Prado

Foi eleita a melhor agremiação nos quesitos Escola de Ouro, Comissão Sensação, e Samba do Ano.
A Paraíso do Tuiuti foi o segundo assunto mais comentado do mundo no Twitter.

A escola contou a história da escravidão, desde a antiguidade até os dias atuais.
Trouxe no enredo a pergunta "Meu Deus! Meu Deus! Está extinta a escravidão?". 
A escola criticou o uso do trabalho escravo, a corrupção, a reforma trabalhista e da previdência, ilustrou a manipulação da classe média paneleira, e trouxe o retrato de um presidente golpista como um vampiro.

Paraíso do Tuiuti liderou as pesquisas de público da UOL, chegando a ter mais de 90%, antes dos seus votos, só seus votos, serem apagados no dia da apuração. 
A escola teve 3 vezes menos tempo de cobertura que outras agremiações no Jornal Nacional, teve toda sua manifestação artística cortada e não exibida na reprise.

Paraíso do Tuiuti não vai ser campeã.

Não vai ser campeã porque quando o pobre enxergou que era escravo, o governo tirou sua educação. 
Quando o pobre decidiu fazer greve, eles tiraram os direitos trabalhistas. 
Quando o pobre se recusou a pagar o preço do rombo, eles ameaçaram sua aposentadoria.
Quando o pobre decidiu manifestar, eles meteram cavalaria, bala de borracha e spray de pimenta.
E quando o pobre resistiu, eles tiraram os remédios, médicos e hospitais.

O pobre viu, então, que o único lugar onde ele ainda tinha voz era na arte, e por lá ele berrou.
Berrou o sofrimento, a angústia, o desespero, de tanto desemprego, de tanta violência, de tanto abuso, tanta morte.
E berrou. Berrou tão alto que o mundo inteiro ouviu.

A Paraíso do Tuiuti não vai ser campeã por isso.
Por ter dado voz ao pobre.
Por ter gritado contra a Casa-grande.
Por ter se levantado contra o Sistema.

Agora o Sistema vai calar a Paraíso do Tuiuti.
E muita gente que foi representado por ela na avenida vai se calar também.
Porque pra eles é só Carnaval.

Infelizmente, é só Carnaval.


Tuiuti: na contramão da história oficial

Por Marcos Bagno

Tuiuti é uma palavra guarani que significa “lodaçal branco”. É o nome de uma região pantanosa do sul do Paraguai onde ocorreu a mais sangrenta batalha campal jamais travada em solo americano. No dia 24 de maio de 1866, o exército paraguaio foi derrotado pelas forças da Tríplice Aliança (Brasil, Argentina e Uruguai), financiadas pelo grande capital britânico (bancos Baring Brothers e Rotschild, entre outros), que não tolerou a ideia de um país autônomo, independente do circuito econômico dominado a ferro e fogo pela Inglaterra imperialista, que impôs o livre-mercado a suas neocolônias sul-americanas. A guerra foi um genocídio: 60% da população paraguaia foi dizimada (mais de 300.000 vítimas) e a imensa maioria dos homens foram mortos, causando um desequilíbrio demográfico que perdura até hoje. O país perdeu várias porções de seu território (parte do atual Mato Grosso do Sul, por exemplo, era terra paraguaia antes da guerra), teve sua economia devastada e seu povo reduzido à fome e à miséria. Já no Brasil, os genocidas se tornaram heróis nacionais e receberam títulos nobiliárquicos: Luís Alves de Lima e Silva se tornou o Duque de Caxias (apelidado de “O Pacificador” pelo tanto de sangue que fez derramar), o Almirante Barroso se tornou o Barão do Amazonas, e o General Osório virou Marquês do Herval. 
Para formar suas tropas, o império brasileiro recorreu aos chamados “voluntários da pátria”, que de voluntários não tinham nada. Centenas de indígenas e caboclos da Amazônia foram sequestrados de suas terras para irem, debaixo de chicote e acorrentados, defender interesses que não eram seus e combater gente de sua mesma etnia, falante de uma língua irmã (o guarani paraguaio, o abanheenga, muito semelhante ao tupi amazônico, o nheengatu). Negros escravizados também foram combater sob a falsa promessa de que, no regresso, seriam libertados. É a mesma, velha e monstruosa história dos povos submetidos à violência colonial e de seus patrões que se vendem fácil aos interesses das grandes potências internacionais. 
Hoje, no Brasil, a gente quase sempre se refere ao Paraguai com deboche e desprezo, como uma fonte de produtos falsificados, o reino das falcatruas, na ignorância de que, antes da guerra, ali ocorreram muitos avanços sociais (como uma importante reforma agrária) que os “aliados” a soldo inglês cuidaram de demolir. Quem anda Brasil afora e Brasil adentro encontra ruas e outros logradouros que comemoram a “vitória” sobre os “tiranos” paraguaios: Voluntários da Pátria, Cerro Corá, Lomas Valentinas, Riachuelo, Avaí, Tuiuti, Humaitá, Passo da Pátria etc. Sem falar nas homenagens aos “heróis” que encheram o solo paraguaio de sangue brasileiro, argentino, uruguaio e principalmente paraguaio. 
É bem provável que o nome do Morro do Tuiuti, no Rio de Janeiro, berço da escola de samba Paraíso do Tuiuti, tenha sua origem numa dessas homenagens à destruição de um povo e de um país, pois a comunidade que ali se formou surgiu justamente no período do segundo império brasileiro.
Seja como for, os criadores do enredo da escola este ano, ao levar para a avenida uma crítica nada sutil aos golpistas mafiosos que estão destruindo o Brasil e espoliando o povo brasileiro, deixaram a nu a farsa da história oficial, denunciando os crimes que há séculos vêm sendo cometidos contra todas as pessoas esmagadas pelos interesses de meia dúzia de donos do poder, fantoches de poderes ainda maiores e mais sanguinários. Não importa o resultado da apuração dos votos: a G.R.E.S. Paraíso do Tuiuti já conquistou a maior e melhor vitória, que é a solidariedade de todos quantos sabem que a história oficial é uma coleção de mentiras e de hipocrisias contadas e recontadas para aplacar a consciência criminosa das classes dominantes. Já ganhou!


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