Mairoridade
Penal: Algumas Falácias
A lei do lumpen é a mais violenta expressão de uma opinião pública insana, e
mostra que a sociedade está podre até a medula.
Timothy Thomas Fortune (1856–1928), jornalista afroamericano, militante antiracista e líder dos direitos civis, referindo-se à frase populista
“clamor da sociedade”, usada pelos racistas para justificar as lei anti-negros.
Carlos Alberto
Lungarzo
15 de maio
de 2013
Numa petição
em favor da redução da maioridade penal (MP) que circula na internet se
fazem várias afirmações falsas. A mais
notável é que existe uma tendência mundial a diminuir a idade penal, e que a
maior parte dos países tem um limiar menor que o Brasil.
Alguns bacharéis
dizem que a idade penal é fixada mais alta nos países atrasados que nos países
desenvolvidos, e que a idade de 18 anos não corresponde ao atual Brasil desenvolvido (?), pois foi inventada nos anos 40 para o Brasil não desenvolvido.
Porém, os
atuais propugnadores da “PEC/33/2012” silenciam o fato de que no Brasil, como
em quase todos os países, há duas idades diferentes de
responsabilidade penal.
1)
Uma é a idade em que o infrator é plenamente imputável; isso significa: ele/ela pode ser julgado(a)
por qualquer tribunal competente, e pode receber qualquer pena determinada em
lei.
2)
Outra é a idade a partir da qual o infrator, mesmo não podendo ser imputado totalmente, pode ser detido,
condenado a uma pena “especial” e recluído em um tipo de prisão especial.
No Brasil, essas prisões especiais se chamam com o sarcástico nome de ”estabelecimentos educativos”.
O fato que mais ocultam os defensores da
redução da idade penal é que este segunda limite para a punibilidade parcial é,
no Brasil, de apenas 12 anos
e não de 18.
Então, falar que um jovem entre 12 e 18 anos fica impune é uma mentira deslavada e torpe,
que qualquer criança que saiba ler
poderia refutar olhando a Lei nº 8.069/90
Esta, em seu artigo 121, § 5º
autoriza o Juiz de Menores aplicar ao adolescente (entre 12 e 18 anos de
idade) internação em “estabelecimento educacional”, que, tirando o cinismo do
eufemismo, significa Prisão especial para jovens. Esta
prisão é tão especial, que em outubro de 1999, a opinião pública internacional
se estremeceu pela barbárie dos procedimentos da FEBEM Imigrantes, e o então presidente
do TJSP, o juiz Bonilha, publicou um panfleto ameaçando as ONGs internacionais
que denunciaram o caso em 12/07/2000
por “violar a
privacidade dos menores” (sic!!!). Só ele não disse que todo menor tem direito
a ser morto e torturado em privado, sem notícias despudoradas.
Dito seja de passagem, a punição para menores pode ser mais dura que a dos adultos, pois o
adulto, ao ser julgado pelo juiz, tem direito, teoricamente, a um advogado, o
qual geralmente consegue melhores condições para o réu, salvo que este tenha a
má idéia de ser negro ou indigente. Quem mandou cometer crime sem antes fazer
fortuna?
No caso da internação na
ex-Febem (ou como se chame atualmente), o agente jurídico decide com absoluto
arbítrio. É relevante (porém não surpreendente), que nesta abundante discussão
sobre a maioridade, não se mencione este fato!
Um truque muito
comum nos propugnadores da PEC em apreço consiste em comparar a idade de
punibilidade plena no Brasil
(18 anos) com a idade de punibilidade parcial
em outros países.
Ou seja,
quando se referem ao Brasi, mostram a idade de punibilidade máxima: 18 anos. Quando se referem
a outros países mostram a idade de punibilidade mínima. Esta idade é
geralmente, 12, 14, 16, salvo no UK e na Suíça onde é 10.
Então, eles comparam e dizem
¾
“Estão vendo: 18 é maior que 12, que 14 e que 16”. Portanto Brasil mais
leniente com os criminosos juvenis que outros países.
Na Itália, Áustria
e Alemanha, e na maioria dos países da Europa ocidental, salvo o UK e Suíça, a
idade mínima de punibilidade parcial é 14
ou mais, ou seja, dois anos a
mais que no Brasil. Já nos países escandinavos, que são os que possuem o menor
índice de criminalidade per capita do planeta, essa idade é 15.
Na maioria
dos países civilizados a punibilidade total tem como limite 18 anos, como no
Brasil, ou ainda maior. Na Alemanha,
um jovem pode ser julgado num tribunal normal e receber penas comuns a partir
dos 18 anos, porém, se ele tiver menos de 24, uma equipe de especialistas
deverá avaliar seu grau de maturidade emocional. Observe que isto não é o mesmo que o exame psiquiátrico
do réu. É uma rotina para todo réu
juvenil. Vide.
(Isto não
acontece nos EUA, onde o limite pode ser até de 7 anos, mas já houve várias elevações da idade mínima em alguns
estados, e o movimento em prol disso continua.)
Também em
Austrália a idade de imputabilidade total é de 18 anos, salvo apenas no estado de Queensland, onde é de 17
anos.
Outra
falácia que veio robustecer os falsos argumentos dos linchadores é a de que nos países subdesenvolvidos a MP é maior que
nos países desenvolvidos. Olhemos estas maioridades penais, e pensemos quão desenvolvidos são estes países:
7
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Por sinal,
observe que quase todos esses países são teocracias, uma forma de governo que
já foi (teoricamente) extinta em Ocidente.
Já Angola, apesar
de ser um país devastado pelas guerras, e com o qual o Brasil mantém certa
relação de “paternalismo”, tem um limite maior que o Brasil para punibilidade
parcial: 16 anos.
Uma mentira
bastante torpe é que há uma tendência
mundial a diminuir a MP. Acontece, porém, todo o contrário. Tanto as organizações mundiais, como grupos não
governamentais e a própria legislação internacional apontam a uma moderação do
sistema de linchamento de jovens patrocinado pelo estado. Um artigo
ilustrativo, baseado em fontes verificáveis, é este:
Como
exemplo, a Dinamarca tinha até há pouco tempo o limite de punibilidade parcial
em 14 anos e o aumentou para 15.
No UK também
se estuda a necessidade de elevar esse limite. Veja http://www.halsburyslawexchange.co.uk/young-offenders-raising-the-age-of-criminal-responsibility
Quanto aos
aspectos acadêmicos e científicos do assunto, a BBC tem difundido recentemente
(vide http://www.bbc.co.uk/news/uk-16153045) estudos
fundamentados de neurocientistas, que mostram que a capacidade de tomar
decisões continua se desenvolvendo durante toda a adolescência e boa parte da
juventude. Esse dado, considerado incontrovertível há bastante tempo, está
influenciando na elevação no limite de imputabilidade. Isso está acontecendo
nos países civilizados, onde os governos preferem guiar-se pela ciência e não
pela superstição.
Este ponto é
importante, porque surpreende a invejável auto-estima dos especialistas em
generalidades, que aduzem supostos avanços “científicos” que provaria que uma
criança já é responsável de suas ações desde cedo. Meus colegas cientistas não
conhecem esses dados, e vou aconselhar a eles se aperfeiçoarem nas faculdades
de direito e comunicação.
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