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terça-feira, 17 de março de 2015

SEQUESTRO RELAMPAGO DE CESARE BATTISTI


O Sequestro Relâmpago de Cesare Battisti

Carlos A. Lungarzo

 

Na última quinta feria, o escritor italiano Cesare Battisti, esteve na situação mais perigosa de sua vida, muito pior que na Papuda, em Frossinone, ou na Santè. Não sei se ele é consciente disso, mas na América Latina e em países como a Itália, a Espanha e a Polônia, os sequestros e posterior extradição ilegal de refugiados é quase rotina.

A presença do ex-senador Suplicy e do excelente advogado Igor Tamasauskas foi imprescindível. Não podemos dizer com precisão que teria acontecido se eles não estivessem estado aí.

O advogado Igor teve a atitude de qualificar esta detenção, durante uma conferência da imprensa na própria sede da PF, como o maior absurdo que já havia visto. Era a primeira vez que eu ouvia-o falar, e fiquei surpreso pela calma, o rigor, mas também a decisão com a qual fez essa denúncia. Logo momento, o absurdo ato já havia ganhado manchetes internacionais, e, desta vez, a imprensa italiana só podia balbuciar algumas bestemmias (xingamentos). Nem sequer as agressões vulgares dos anos 2009 a 2012 tiveram coragem de proferir. Por sua vez, a maior parte da mídia francesa foi muito honesta e objetiva.

A denúncia de Igor de que o ato havia sido um absurdo, que a juíza tentava entorpecer o processo e precipitar a extradição sem que defesa pudesse analisar os autos foi de grande impacto. Mais efetiva ainda foi a denúncia de que a juíza não publicou a sentença no diário oficial, não deu prazo para o direito de defesa, não informou o próprio advogado, e mandou prender bruscamente a Battisti para obstruir o devido processo.

Tudo isto é verdade, nada é exagero. De fato, Battisti tem direito a todos os recursos contra a sentença, que são três, e podem tomar dois anos e até mais. A juíza queria que ele não tivesse nenhuma oportunidade. A prisão “temporária” (segundo os agentes federais) tem todo o aspecto de ser apenas uma máscara para uma extradição clandestina durante a madrugada.

Logo em seguida de que esta breve entrevista saiu ao ar, recebi vários e-mails de amigos jornalistas da França, a Suíça e a própria Itália, pedindo que mandasse algum texto da Internet onde estivesse reproduzida a manifestação do advogado, porque em alguns países da Europa jornalistas e juristas não acreditavam que uma barbárie desse tamanho pudesse ser feita, mesmo na América Latina. Dois dias depois, recebi a visita pessoal de uma jornalista da AFP, também espantada pelo inusitado da situação. Jornalistas italianos do jornal Il Garantista, um jornal diário que defende os direitos humanos, não entendia como a ação dessa juíza não havia sido impedida pelos mesmos corregedores de justiça.

A farsa inventada pelo procurador de Brasília mostra que ele contava com a falta de informação de muitas pessoas. Lamentavelmente, nossos jornalistas conhecem pouco de sutilezas jurídicas. Battisti, que é um estrangeiro com radicação definitiva no Brasil e RNE, é tratado em muitos jornais (inclusive de maneira amigável) como refugiado. É natural, então, que a maioria não entenda a diferença entre expulsão e extradição.

Com efeito, pessoas de nossa rede de defesa de Cesare, mandaram mensagens desesperadas com um conteúdo deste tipo: “É necessário fazer algo rápido. Se ele passar a noite na PF, pode ser morto ou entregue a Itália”.

Eu nunca tive dúvidas de que esse era o plano, mas, se tivesse tido, era só ler a Ação Civil Pública daquele inquisidor para sair das dúvidas.

Ele pede “deportação” para México ou Brasil. Leram bem, DEPORTAÇÃO. O que é isso? E o mesmo que expulsão? Não, é algo bem explícito, um caso muito específico e draconiano de expulsão.

Segundo a lei 6815

Artigo 58 - A deportação consistirá na saída compulsória do estrangeiro.

Parágrafo único - A deportação far-se-á para o país da nacionalidade ou de procedência do estrangeiro, ou para outro que consinta em recebê-lo.

 

Vejamos claramente as três possibilidades:

a)       País da Nacionalidade. Então, é a Itália. Portanto, a deportação coincide com a extradição.

Vocês acham que, quando Battisti chegasse a Fiumicino, a Itália perguntaria: “Por favor, o que devemos fazer? Ele foi deportado, ou está sendo extraditado como a gente pediu?

A extradição foi definitivamente rejeitada pelo Presidente, em 31/12/2010 e pelo STF, que aprovou a decisão de Lula, em 8/6/2011, por 6 votos a três.

b)       País de procedência. Aí é a França. OK. Mas, o Promotor e a juíza do DF deveriam saber, que na França há um decreto de extradição de 2005, que ainda não foi revogado.  Logo, novamente haveria extradição.

c)       País que aceite o receber. Muito bem. O Procurador indica México, e a juíza concorda. Mas, como eles sabem que o México o receberia? Onde está a prova de que Itamaraty já negociou isso com Tlatelolco? Nenhum país está obrigado a receber um estrangeiro. Pode fazê-lo por interesse, por cortesia ou por razões previstas em lei. Mas, então é necessário solicitar.

 

 

Incrível o cinismo desta galera. Eles estavam preparando a extradição relâmpago de Battisti.

Se o advogado não houvesse atuado com essa velocidade, e o desembargador não tivesse respondido adequadamente, Battisti teria passado em sua cela da PF a primeira parte da Noite. A partir das quatro, hora favorita dos policiais, quando suas pressas estão no mais profundo do sonho e as ruas estão mais desertas, ele poderia ter sido enfiado numa viatura com rumo a Guarulhos. Um procedimento fácil, rotineiro, nada que precise das habilidades de Jack Bauer.

Talvez, hoje ou amanhã, ele apareceria uma cela de Rebibbia, tendo-se se suicidado num ato de desespero. Mas, suicidado como? Com uma gravata, claro. Ele sempre usa gravatas de grife italiana. (Rssss)

A repetição de um golpe como este, mais cedo ou mais tarde, não pode ser descartada. Sobretudo, por causa de que, numa sociedade não já de classes, mas de castas, os juízes são intocáveis, como os antigos xamãs das tribos.

Portanto, nosso comitê de apoio deve coordenar todos os esforços para denunciar detalhadamente o autor desta nojenta Ação Civil Pública e a magistrada que se tornou sua cúmplice aos foros internacionais, e aproveitar este momento de sensibilidade da imprensa dos países democráticos.

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