A presidente Dilma Roussef sabe que o ministro Nelson Jobim e militares de altas patentes das três armas são contra a Comissão Nacional da Verdade, prevista no Projeto de Lei 7376/10, do Executivo. E pede para que Jobim, generais e subalternos que consideram a ditadura militar ainda existente, embora oficialmente nas mãos dos civis, não se manifestem a respeito.
Não manifestem contrariedade à Comissão da Verdade, para evitarem maiores danos à mentira instituída.
Enquanto isso, cinco dias depois do massacre de Realengo, no dia 12 de abril, Nelson Jobim, militares e simpatizantes participaram, no Rio de Janeiro, da Feira Latinoamericana de Aviação e Defesa (LAAD, na sigla em inglês), que é a maior exposição de fabricantes de armamentos e equipamentos militares e de defesa. A Feira é latinoamericana, mas a sigla é em inglês, a língua adotada por militares saudosistas brasileiros.
Foi bem no período em que o Governo aproveitou a mídia resultante do massacre de Realengo para propor um novo plebiscito visando o desarmamento geral do povo brasileiro. Só ficarão armados os bandidos, a polícia e as Forças Armadas. Ótimo para os bandidos.
A tal feira de armamentos onde as empresas bélicas da América Latina expuseram as suas novidades, para delícia dos militares (e simpatizantes) durou cinco dias. O resultado foi a disposição do Governo em gastar cerca de 30 bilhões de reais, nos próximos 15 anos, para reaparelhar as Forças Armadas.
Já no final de março, João Lucena Leal, pessoa estreitamente ligada aos órgãos de repressão da época da ditadura militar, fez a apologia da tortura, ao conceder uma entrevista ao jornalista Roberto Cabrini, veiculada na quarta-feira, 30 de março, no programa Conexão Repórter, do SBT. “Eu executava a tortura com nobreza”, disse ele. “Não tinha ideologia, apenas cumpria o meu dever de obter informações”. Lucena afirmou ter acompanhado a execução sumária de 15 guerrilheiros do PC do B na região do Araguaia, na década de 70. “O sujeito amarrado, algemado e o executor puxava o gatilho e matava”, narrou.
Quando saiu a matéria, no mesmo período em que começou a novela do SBT, “Amor e Revolução”, os militares ficaram indignados e queriam se manifestar, dizendo que não é possível, como é que vão revelar os segredos tão zelosamente guardados sobre como eles matavam e torturavam. Por isto, Dilma pediu que ficassem quietos. O silêncio é o maior amigo da mentira.
Mas não adiantou. Militares da reserva organizaram um abaixo-assinado pela retirada da novela do ar, encaminhado ao Ministério das Comunicações. Em oposição a isso, militantes do grupo "Documento Tortura" fizeram outro abaixo-assinado, pedindo a manutenção da veiculação. Não há indícios de que o governo tenha a intenção de tirar a novela do ar. Por enquanto.
E o grupo "Tortura Nunca Mais – RJ" lançou um documento na Internet, intitulado “Dossiê de João Lucena Leal”, no qual você poderá ler que o defensor da nobreza da tortura – e não deverá ser o único defensor dessa tão nobre atividade militar - é atualmente advogado inscrito na OAB de Rondônia sob o n.º 52B. É advogado de Darly Alves da Silva, um dos acusados pelo assassinato do líder seringueiro Chico Mendes.
João Lucena é citado em quatro diferentes listas do "Projeto Brasil Nunca Mais", contidas no tomo II, volume III “Os Funcionários”. Na primeira lista “Pessoas diretamente envolvidas em torturas”, seu nome aparece 7 (sete) vezes, às páginas 26 e 32. É indicado como policial e/ou agente da Polícia Federal do Ceará e tais denúncias referem-se aos anos de 1970 e 1973.
Mas isso tudo não interessa ao Nelson Jobim ou ao general José Elito de Carvalho Siqueira, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que disse em entrevista que "não é motivo de vergonha para o País o desaparecimento de presos políticos durante a ditadura militar" (1964-1985).
É verdade que o general foi repreendido pela presidente e pediu desculpas, dizendo que era tudo culpa da imprensa. Mas mostra que a ideologia da segurança nacional, que foi motivo para tantos assassinatos e torturas durante a ditadura militar está renascendo durante o governo de Dilma, tão bem servida com ministros como o general José Elito e Nelson Jobim.
A festa continua, para eles. Se Dilma cumpre o seu papel de puxar as orelhas dos ministros que falam demais, isso não tem a menor importância. Eles sabem que Dilma jamais se atreveria a ir além de um puxão de orelhas ou seria ela a ser demitida do cargo de Presidente.
Tanto é assim, que o Nelson Jobim está para lançar, no dia 28, o seu Livro Branco das Forças Armadas. Seguindo o exemplo dos Estados Unidos, França, Argentina, Uruguai, Peru, Guatemala, Chile, El Salvador e Canadá - países militarizados ou em via de acelerada militarização. Honduras, Colômbia, Panamá, Guatemala, República Dominicana, Costa Rica e Haiti não terão Livro Branco, porque já estão ocupados pelos Estados Unidos – direta ou indiretamente.
Oficialmente, será uma declaração de princípios sobre como o Brasil deve encarar suas Forças Armadas, e permite que outros países conquistem a confiança em relação ao Brasil. Ou uma declaração de intenções.
Estamos cercados por inimigos tão terríveis que será necessário que eles saibam que estaremos prontos para puxar o gatilho, se necessário for. Ou, conforme Nelson Jobim, é necessário defender as fronteiras contra o tráfico internacional, porque o Brasil não permitirá a internacionalização da Amazônia. Nos Estados Unidos as crianças em idade escolar aprendem que a Amazônia brasileira não é mais brasileira. Será que o recado do Jobim foi para os seus amigos norte-americanos?
Na realidade, o Livro Branco da Defesa Nacional será uma arma dos militares contra as trocas de governo e os cortes orçamentários frequentes. Estará tudo ali, para ser lembrado – e cobrado – dos governantes. Ou talvez seja uma maneira de mostrar aos países que não estão alinhados com os Estados Unidos - como aqueles que formam a Aliança Bolivariana das Américas (ALBA) - que o Brasil está rearmando as suas Forças Armadas, e qualquer coisa...
Quanto à Comissão da Verdade? Bem, parece que isso é coisa de civis e não interessa para o atual governo.
Fausto Brignol.
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