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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

O SENHOR DO KARMA

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A figura histórica de Jesus é bastante controversa, mas o seu significado e simbolismo são muito interessantes.

     Controversa, porque, independente da fé de cada um, sabe-se que o Cristianismo começou a aparecer para o mundo como religião oficial imposta aos povos ocidentais logo após Constantino assim a ter declarado e ratificado no Concílio de Nicéia. Portanto, uma religião que já nasceu aliada ao império então dominante, assimilando a sua ideologia. E, através do Império Romano, impôs-se, gradativamente às religiões então existentes, que os padres da Igreja, generalizando, chamaram de paganismo.

     Para poder destruir aquelas religiões pagãs, o Cristianismo da época precisou assimilar os seus usos e costumes, suas tradições e até o seu conhecimento, assim dito esotérico. Tudo isso, com o objetivo de unificar os povos submetidos ao império através de uma única religião, que representava, simbolicamente, o poder centralizador.

     Como uma espécie de partido político dominador, porque o Império Romano necessitava de uma reestruturação, estando ele ameaçado por todos os lados pelos povos que ainda eram “bárbaros” em seus hábitos e cultura, que tinham herdado, uns dos outros, deuses, crenças e diversas maneiras de encarar o mundo restrito em que viviam e o universo desconhecido que os cercava.

     O Império Romano necessitava agregar aqueles povos a si ou ser definitivamente destruído. E o Cristianismo foi o fator de coesão, o ponto catalisador entre o Império já decadente e dividido e os demais povos.

     Mas, para isso, teve de ceder um pouco de si mesmo. Teve de ceder frente ao Império aquela força moral que o mantinha unido em uma única fé, uma única certeza e visão de mundo. Reunidos em Nicéia, em 325 - naquele concílio que ficou célebre por instituir como verdade o mistério da Trindade, decidir sobre a celebração da Páscoa, repudiar o arianismo (teoria defendida pelo presbítero Ário, que negava a divindade de Jesus), e instituir os cânones básicos da Igreja Católica - cristãos que eram governados por outros cristãos mais eruditos sentiram-se na obrigação de concertar um acordo com os doutores da Igreja, aceitando aquelas verdades como únicas e incontestáveis ou serem expulsos da congregação dos fiéis.

     Naquele tempo, muitos cristãos ainda não tinham Jesus como Deus – mas como uma espécie de profeta escolhido por Deus para divulgar os caminhos da fé. Outros, não acreditavam na virgindade de Maria, mãe de Jesus, ou em sua divindade. Mas Constantino soube lidar com todos eles, em Nicéia, ao exigir dos pais da Igreja que esta fosse estabelecida sobre cânones e dogmas que a sustentariam e seriam como colunas morais do Império Romano claudicante.

     Para triunfar e tornar-se a única religião do império, a Igreja Católica, agora Romana, teve que suplantar outras religiões preferidas pelos romanos. Principalmente o Mitraísmo.

MITRA

     O Mitraísmo teve origem na mitologia persa e foi trazida para Roma pelos soldados romanos.

     O culto de Mitra chegou à Europa onde se manteve até o século III. O símbolo de Mitra era o touro, usado nos sacrifícios à divindade. A morte do touro, que representaria a Lua, era característica desse mistério que se espalhou pelo mundo helênico e romano por meio do exército. A partir do século II o culto a Mitra era dos mais importantes no Império romano e numerosos santuários (Mithraea, singular Mithraeum) foram construídos. A maior parte eram câmaras subterrâneas, com bancos em cada lado, raras vezes eram grutas artificiais. Imagens do culto eram pintadas nas paredes, e numa delas aparecia quase sempre Mitra que matava o touro sacrificial.

     A religião cristã, que foi levada pelos judeus para Roma, para ser aceita pelo povo como a única religião do império teve que assimilar muitas características do mitraísmo. Por exemplo, desde a antigüidade, o nascimento de Mitra era celebrado em 25 de dezembro. A celebração do Natal Cristão em 25 de dezembro surgiu por paralelo com as solenidades do Deus Mitra, cujo nascimento era comemorado no Solstício (de inverno no hemisfério norte e de verão no hemisfério sul). No calendário romano o solstício acontecia erroneamente no dia 25, em vez de 21 ou 22. Os romanos comemoravam na madrugada de 24 de dezembro o "Nascimento do Invicto" como alusão do alvorecer de um novo sol, com o nascimento do Menino Mitra.

     Jesus, Mitra, Sol Invicto. Todas as religiões antigas sempre cultuaram o grande mistério das mudanças de estações: solstícios e equinócios. Tinha-se que saber o momento de plantar e o momento de colher. O momento em que a vida se encolhe, em suposta morte e o corpo se enregela e fica rígido para, depois, aos poucos, desfazer-se, e nesse desfazer-se aparente novamente originar a vida. Os povos, por mais antigos que fossem, reconheciam que a vida é uma doação, uma doação eterna. E agradeciam por isso. Descobriram que a Natureza nada mais é que a vida revelada e que nós, seres humanos, como a parte consciente do universo que, além de prolífico em manifestações, é mental e espiritual a um só tempo – mas em um tempo que não é tempo, não é contado nem deduzido, e este é o seu grande mistério – tínhamos uma obrigação maior ainda de agradecer e festejar cada uma das quatro belas faces com que a natureza revela a sua magnitude e o seu poder, conscientes da aparência dessa demonstração de força, que é criada na mente do Incognoscível.

     Por isto, as festas iniciáticas dos povos pagãos aconteciam durante os solstícios e os equinócios, quando alguns segredos eram revelados para os neófitos, geralmente através de belas alegorias, como a do deus Mitra matando o touro para fecundar a Terra com o seu sangue. Morte, transformação, renascimento. A necessidade da morte, assim como a necessidade da vida. A dualidade cósmica. A impossibilidade de algo existir sem que haja o seu oposto. Tudo é 2 para que haja o 3 e para que o 3 seja o 1 manifestado, porque o 1 é explosão e inércia ao mesmo tempo; revelação de um novo universo, enquanto desvela a certeza de um não-universo equivalente.

     E aqueles que bebiam o sangue e comiam o corpo do touro sacrificado – símbolo da força da Terra – tinham um pequeno vislumbre da eternidade que chamamos de vida, mas que também é morte. E ficavam orgulhosos por serem deuses no instante em que descobriam os segredos do deus; e aprendiam a ser humildes ante a imensidão dos segredos dos multiversos.

     Provavelmente, os cristãos do século III, que conheciam de Jesus uma pequena história e necessitavam mitificá-lo para trazer a si as religiões que preponderavam entre os romanos, tenham adotado grande parte da simbologia do mitraísmo.

     Segundo os relatos míticos, Mitra nasceu em uma caverna, no dia 25 de dezembro, e foi adorado por pastores. O rito principal do mitraísmo era um banquete que tinha algumas semelhanças com a eucaristia do cristianismo. Achados arqueológicos revelaram que os alimentos oferecidos no banquete eram o pão e o vinho. O simbolismo era o mesmo do cristianismo. Quando Mitra mata o touro, nasce trigo do sangue espargido, simbolizando uma nova vida. O sacrifício de Jesus tem o mesmo significado: morte e ressurreição.

     Mas o cristianismo fez algumas concessões e aperfeiçoamentos. Enquanto o mitraísmo era uma religião de cunho iniciático, que só admitia homens nos mistérios, o cristianismo mostrou-se como religião aberta a todos, inclusive mulheres, e provavelmente a santificação de Maria, mãe de Jesus tenha sido um dos pontos principais para tornar o cristianismo uma religião bem mais popular que o mitraísmo.

DRUIDISMO

     Quando o cristianismo foi institucionalizado como religião oficial do Império Romano, além do mitraísmo e da religião do Sol Invicto, outras religiões proliferavam entre os povos ainda dominados pelos romanos, entre as quais destacava-se, entre os celtas, o druidismo.

     O druidismo se baseava em dois grandes princípios: o respeito à natureza e a crença na imortalidade. Os druidas eram os sacerdotes, presidiam as cerimônias religiosas e exerciam outras funções. Acreditavam na figura suprema da Deusa-Mãe, que simbolizava a Terra e as suas dádivas. Os sacerdotes druidas conheciam as forças telúricas da natureza e a utilizavam nos seus ritos mágicos. Além dos dólmens e menires – gigantescas rochas erguidas em determinados locais para marcar as correntes terrestres em harmonia com o Cosmos e onde eram realizados rituais secretos – tinham em seus templos imagens femininas, que mais tarde foram cognominadas de “virgens negras”, provavelmente utilizadas em seus rituais iniciáticos ou simplesmente para simbolizar a deusa-mãe, ou “a Deusa”.

     A crença na Deusa era muito forte entre os povos celtas, que não podiam aceitar um deus masculino como criador e sustenedor da natureza. O cristianismo usou a santificação de Maria como maneira de dominar aqueles povos também através da religião, colocando-a ao lado de Jesus em poder e até um pouco acima para a visão dos povos que estavam sendo aculturados, porque Maria foi dita como sendo a “Mãe de Deus” - virgem e geradora. E aquelas estátuas das virgens negras encontradas em território celta foram tidas como imagens de Maria.

     Os sacerdotes druidas e as sacerdotisas druidesas não se deixaram enganar, mas os povos celtas, aos poucos, foram aderindo ao cristianismo, que tinha não só uma Deusa, como também um Deus – além de ser uma religião aberta a todos, iniciados e não iniciados.

     E enquanto aqueles povos – celtas e demais “bárbaros” – que cercavam o Império Romano e eram por ele assimilados, e posteriormente o derrubaram, mas continuaram cristãos, não tinham provas escritas das suas crenças ou, se as tinham, estavam em mãos dos altos sacerdotes iniciados e distante do povo, a Igreja Católica Romana não só usava o sincretismo religioso na sua luta contra as religiões “pagãs” como tinha em mãos uma prova escrita que dizia ser divina, inspirada diretamente por Deus. A Bíblia.

A BÍBLIA

     Os primeiros seguidores de Jesus que, inspirados por Paulo, resolveram-se a catequizar os gentios e foram até Roma, a capital do Império, levavam consigo, além das lembranças, alguns escritos – os Evangelhos – que presumivelmente contavam a história de Jesus, dos 30 aos 33 anos.Eram muitos os escritos sobre Jesus, e não somente os quatro evangelhos canônicos aceitos oficialmente hoje. E muitas as histórias contadas através daqueles escritos.

     Em 70 d.C., quando a fé romana ainda era de origem helênica, com influências persas e celtas, ocorreu a segunda dispersão, ou diáspora, do povo judeu pelo mundo, após terem sido derrotados pelos romanos em Jerusalém. Isso fez com que se espalhassem por diversos países e continentes, incluindo a Europa.

     Há indícios que os judeus que foram para a Europa entraram em contato com os cristãos, que também eram judeus em sua maioria e que, desta vez, tenha havido outro sincretismo: o da história do povo judeu (Velho Testamento) com a história de Jesus (Novo Testamento). Desse sincretismo surgiu a Bíblia.

     A Bíblia é um conjunto de pequenos livros ou uma biblioteca. Foi escrita ao longo de um período de cerca de 1600 anos por 40 homens das mais diversas profissões, origens culturais e classes sociais, segundo a tradição judaico cristã. No entanto, exegetas cristãos divergem sobre a autoria e a datação das obras.

     Mateus, Marcos, Lucas e João são os únicos evangelhos aceitos pela Igreja Católica e pelos evangélicos como legítimos e que portanto integram o Novo Testamento da Bíblia. O cânon começou a ser definido por volta de 150 d.C. durante a controvérsia marcionita e aparece documentado pela primeira vez na forma atual em 367, em uma carta de Atanásio, bispo de Alexandria. O Terceiro Sínodo de Cartago em 397, ratificou o cânon aceitado previamente no Sínodo de Hipona Regia, realizado em 393 onde hoje é a Argélia. O Livro de Apocalipse foi contestado sua inclusão no cânon por toda a Idade Média, sendo aceito por católicos e protestantes no Século da Reforma.

     Além dos quatro evangelhos canônicos, existem os livros apócrifos. Muitos são de origem gnóstica e alguns deles foram escritos mais de 200 anos após a morte de Jesus. Dentre os quatro evangelhos, três são chamados de Sinópticos (do grego “syn” = junto), porque apresentam grandes semelhanças entre si: Mateus, Marcos e Lucas. Desses três, sabe-se que Lucas não foi apóstolo, mas uma espécie de “repórter” da época, que pesquisou a vida de Jesus junto aos seus seguidores e a escreveu.

     Foi São Jerônimo, tradutor da Vulgata latina, em fins do século IV, que chamou pela primeira vez ao conjunto dos livros do Antigo Testamento e Novo Testamento de "Biblioteca Divina". A Bíblia é uma coleção de livros catalogados, considerados como divinamente inspirados pelas três grandes religiões dos filhos de Abraão (além do cristianismo e do judaísmo, o islamismo). São, por isso, conhecidas como as "religiões do Livro". O Concílio de Trento, em 1541, estabeleceu um texto único para a Vulgata a partir de vários manuscritos existentes, o qual foi oficializado como a Bíblia oficial da Igreja e ficou conhecido como Vulgata Clementina.

     É composta de 46 livros (alguns admitem apenas 39) do Velho Testamento (história do povo judeu) e 27 escritos do Novo Testamento (história de Jesus).

     O sincretismo bíblico entre o Antigo e o Novo Testamentos fez com que muitos dos ensinamentos de Jesus ficassem diluídos, e grande número de cristãos, talvez a maioria, até hoje acredita que o Novo Testamento é apenas uma continuação do Antigo Testamento.

JESUS

     Na verdade, não é. Os ensinamentos contidos nos quatro evangelhos canônicos – e até nos apócrifos – mostram Jesus como uma pessoa que veio pregar uma nova forma de encarar a vida e não exatamente para reformar a velha lei judaica, com a qual não concordava inteiramente.

     Sendo uma pessoa espiritualizada fazia diversos milagres, principalmente curas de doentes. Embora tenha sido deificado após a sua morte, ela nunca afirmou ser filho de Deus, mas Filho do Homem, significando que era um ser humano. Estava acima de um ser humano comum, não se prendia a bens materiais, tudo indica que era celibatário e pregava aos seus discípulos que para tudo bastava ter fé.

     Mas a fé que Jesus pregava também foi mal interpretada. Hoje, cristãos do mundo inteiro pensam que ter fé é o mesmo que acreditar ou rezar para Deus, que tudo se resolverá. No entanto, segundo o que se lê nos evangelhos, a fé que Jesus pregava ia além de mera crença. Significava acreditar em si mesmo, ter confiança na sua própria força vital e no poder de transformação que está contido em cada ser humano.

     Nos evangelhos ele repete essa interpretação de fé constantemente aos seus discípulos, que foram escolhidos entre pessoas comuns e não entre sacerdotes iniciados. Aliás, ele chamava os sacerdotes de hipócritas e de “sepulcros caiados”. Que nada deixariam para ninguém, nem mesmo a sua suposta sabedoria.

     Era contra os sacrifícios de animais no templo e disse que deixaria para os discípulos somente dois mandamentos: 1. “Amar a Deus sobre todas as coisas; 2. “Amar ao próximo como a si mesmo”.

     “Assim como”. Esta expressão também está na oração que ele deu aos apóstolos, a que chamamos de “Pai Nosso”. Naquela frase, “Perdoai as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores” – fica claro o significado.

     Mais tarde, a Igreja mudou para “perdoai as nossas ofensas” – talvez temendo a reação dos mercadores.

     Mas Jesus deixou claro que as “nossas dívidas” somente serão perdoadas na mesma proporção em que perdoarmos “os nossos devedores”. Deu a entender que não basta pedir a Deus, mas temos que ser merecedores daquilo que pedimos. Também no seu segundo mandamento – “Amar ao próximo como a si mesmo” – ele deixa claro o condicional. Você só poderá amar ao próximo na mesma medida em que amar a si mesmo.

     Desta forma, ele se revelou como Senhor do Karma, porque a história da sua vida revela que fazia aquilo que ensinava, e por isso purificou-se, fez prodígios e ressurgiu dos mortos.

     Ensinando para pessoas comuns, muitas vezes através de parábolas, mostrava que tudo o que fazemos aqui tem uma repercussão cósmica e que só teremos resultados de nossas preces na justa medida do nosso merecimento.

     A lei do Karma é a lei de causa e efeito, ação e consequência. Geralmente é relacionada às religiões que pregam a reencarnação, como o Budismo e o Hinduísmo, assim como o Kardecismo. Nessas religiões, acredita-se na roda das encarnações. As pessoas estariam destinadas a reencarnar neste mundo até cumprirem toda a sua dívida kármica em relação a si mesmas e aos outros. Quando isso acontecesse, passariam para um estágio mais avançado da evolução cósmica.

     Jesus não pregava a reencarnação, mas a ressurreição - o que ele chamava de vitória sobre a morte. Mas ensinava aos seus apóstolos a lei do karma, mesmo que ele não a citasse nominalmente, mas aplicada a esta vida neste mundo. A recompensa dos que fossem puros seria o que ele denominava de “Reino de Deus”. Os demais seriam “queimados” no Inferno – um simbolismo para a negação da vida aos que negarem a vida.

     Para que os seus segudores alcançassem a pureza seria necessário harmonizar-se com a Natureza, nada desejando deste mundo a não ser aquilo que nos é dado a cada dia – assim como as flores e os pássaros, conforme ele cita em uma de suas parábolas.

     O sistema capitalista – acumulação de riquezas e geração de lucros – é totalmente oposto ao Cristianismo. E a Igreja Católica Romana e as demais igrejas cristãs são claramente capitalistas, o que as afasta totalmente dos ensinamentos de Jesus.

     É muito provável que não tenhamos mais uma verdadeira igreja cristã no mundo atual, onde o lucro e a obsessão por riquezas tornou-se o principal objetivo das pessoas.

     Vejam o Natal que, a princípio, seria a festa do nascimento de Jesus. Tornou-se a festa do comércio, quando as pessoas saem, desesperadas, para comprar presentes umas para as outras, porque a mídia dominante assim manda – e é a esta mídia que as pessoas obedecem e a nenhum outro deus.

     Voltamos ao paganismo no seu sentido mais feio e execrável. O Capitalismo tornou as pessoas egoístas e insinceras, principalmente consigo mesmas.

     Percebeu-se, no início deste século, uma clara tentativa de dessacralizar Jesus e o pouco que restava dos seus ensinamentos. Objetiva-se uma Nova Ordem Mundial, com uma só religião e um só modo de pensar. Para isso, livros foram e estão sendo escritos. E por isso, há quem negue a sua existência, porque não existem provas além dos evangelhos.

     No entanto, esta não é a questão. Os ensinamentos de sua suposta pessoa e a sua maneira de agir, sempre em concordância com o que pregou, é que é o mais importante. Porque pregou simplesmente a paz, o amor, a harmonia com a Natureza, o respeito entre as pessoas e a naturalidade em relação à vida. E a não aceitação das “tentações”, do luxo desnecessário, do consumismo degradador.

     E é isso que incomoda àqueles que querem a dessacralização de Jesus, querem a prova da sua não existência, buscam ansiosamente provas de que ele não ressurgiu dos mortos, de que ele foi casado e teve filhos. Que foi apenas um mito.

     Se foi um mito, que belo mito! E que belo exemplo de vida e de sacrifício pelos seus semelhantes!

     Parte da história desse “mito” conta que Ele teria lutado contra o que chamava de “Príncipe deste mundo” – e vencido. Mas os cristãos de hoje, liderados por suas igrejas, preferem obedecer so Príncipe deste mundo e ceder às suas ofertas. E acreditam ser cristãos.

     Se foi um mito, foi muito humano.

     Bradou contra os vendilhões do tempo, contra os capitalistas da época, que usavam a religião judaica com único interesse no lucro pessoal. Angustiou-se na noite anterior à sua morte e pediu a Deus que, se fosse possível, afastasse dele aquele cálice de amargura – porque teve medo da morte, como todos nós. Mas foi coerente com a sua fé e acrescentou: “que seja feita a Sua e não a minha vontade”.

     Dizem que foi indevidamente divinizado, mas acredito que tornou-se divino ao revelar o seu todo humano. Muito além dos deuses de pedra e dos hipócritas rituais iniciáticos daqueles que se pensam deuses, e se rendem ao deus das ilusões materiais.

     Não é apenas a mensagem de paz e de amor que devemos passar uns para os outros, neste Natal. Além da mensagem, a ação, porque Jesus era um homem de ação. Expulsava os mercadores do templo, denunciava a hipocrisia.

     O verdadeiro cristão não necessita de um Papa ou de um Arcebispo de Canterbury. Não necessita de bispos que o representem. Não acha necessário grandes ou pequenas igrejas para orar.

     Quando perguntado a respeito, Jesus disse que as orações deveriam ser feitas em lugares tranquilos, de preferência dentro de casa. Que rezassem para o deus íntimo que está em segredo dentro de cada um, agradecendo pelo pão de cada dia e pedindo perdão pelas faltas. Que não fizessem como os hipócritas, que gostam de fingir a sua crença diante de todos. Jesus era radicalmente contra a hipocrisia.

     O verdadeiro seguidor dos ensinamentos de Jesus deve ser, antes de tudo, um indignado contra o terrível mundo em que vivemos. Não só um indignado, mas um lutador pelas causas justas. Deverá saber espalhar-se pelo mundo e dizer não aos que matam, torturam, provocam guerras e degradam a natureza.

     O cristão deve estar na linha de frente, desmascarando as falsidades que nos cercam. Um pregador da paz e da esperança mas também um construtor da paz e da esperança. Não apenas em palavras ou através de atitudes dúbias e acomodadas, mas por seu agir constante e incansável.

     Cabe aos pouquíssimos cristãos que ainda restam, não só neste Natal, mas em todos os momentos - com força e valentia, como Jesus - continuar a expulsar os mercadores e a dizer não à hipocrisia.



Fausto Brignol.


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