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segunda-feira, 30 de novembro de 2009

BALANÇO FINAL DO "BENJAMINGATE": SÓ MAIS UM FACTÓIDE DA "FOLHA"

Como jornalista, aprendi que nada é impossível.

Então, depois de ler, estarrecido, o texto no qual o cientista político Cesar Benjamin acusava o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de lhe haver relatado uma tentativa de estupro que teria cometido em 1980, resolvi esperar a evolução do caso antes de condenar inapelavelmente quem um dia foi herói deste sofrido país.

Mas, a minha avaliação inicial foi das mais negativas. Dai haver afirmado claramente, em artigo escrito de batepronto, que o relato de Benjamin, da forma como foi apresentado, lhe valeria uma condenação como caluniador em qualquer tribunal.

Algo assim só seria aceitável com a corroboração da suposta vítima ou, pelo menos, das outras pessoas que ele afirmou estarem presente na conversa.

Nas edições subsequentes, a Folha de S. Paulo nada acrescentou que verdadeiramente respaldasse a versão de Benjamin -- o qual não se manifestou, sequer.

E as reações vieram em cascata:
  • o publicitário Paulo de Tarso da Cunha Santos, citado por Benjamin, afirmou que "o almoço a que se refere o artigo de fato ocorreu", que "o publicitário americano mencionado se chamava Erick Ekwall", e que não houve "qualquer menção sobre os temas tratados no artigo";
  • ex-companheiros de cela de Lula no Dops, José Maria de Almeida (PSTU), José Cicote (PT) e Rubens Teodoro negaram a tentativa de estupro, tendo Almeida acrescentado que não havia ninguém do Movimento pela Emancipação do Proletariado na cela e Cicote se lembrado vagamente de que um sindicalista de São José dos Campos seria apelidado de "MEP";
  • Armando Panichi Filho, um dois dois delegados do Dops escalados para vigiar Lula na prisão, disse nunca ter ouvido falar disso e não acreditar que tenha acontecido, mesmo porque, segundo ele, nem sequer havia "possibilidade de acontecer”;
  • o então diretor do Dops Romeu Tuma também desmentiu "qualquer agressão entre os presos";
  • o Frei Chico, um dos irmãos do presidente Lula, lembrou que a cela do Dops era coletiva e que nunca Lula ficou sozinho, pois estava preso com os outros diretores do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo (Rubão, Zé Cicote, Manoel Anísio e Djalma Bom);
  • Lula, de acordo com o chefe de gabinete da Presidência, Gilberto de Carvalho, teria ficado triste e abatido, afirmando que isso era "uma loucura".
A Veja, como era previsível, correu a magnificar o patético episódio -- tanto que acabou descobrindo quem seria a suposta vítima. Trata-se de João Batista dos Santos, ex-metalúrgico que morou e militou em São Bernardo. Dignamente, ele bateu com a porta na cara da revista, mandando um amigo dizer que "quem fez a acusação, que a comprove”.

Despeitada, a Veja fez questão de acrescentar que João "há cerca de três anos, ganhou uma indenização da Comissão de Anistia e foi viver em Caraguatatuba, no Litoral Norte de São Paulo", como se isto desqualificasse seu posicionamento.

TENDLER: BENJAMIN FEZ JUS
AO TROFÉU DE "LOIRA DO ANO"

De tudo que foi publicado, quem trouxe mais luzes para a compreensão do imbroglio foi o cineasta Silvio Tendler, participante do encontro cujo nome Benjamin disse ter esquecido.

A coluna da Mônica Bergamo fez uma rápida menção ao esclarecimento de Tendler, registrando que ele recomendara jocosamente a outorga a Benjamin do "troféu de loira [burra] do ano" por não haver entendido "uma brincadeira, como outras 300" que o Lula fazia todos os dias.

Mas, a Folha ficou devendo a seus leitores o relato completo do cineasta. que praticamente pulverizou seu factóide. Vide estes trechos:
"O Lula adorava provocar... era óbvio para todos que ouvimos a história, às gargalhadas, que aquilo era uma das muitas brincadeiras do Lula.

"Todos os dias o Lula sacaneava alguém, contava piadas, inventava histórias. A vítima naquele dia era o marqueteiro americano. O Lula inventou aquela história, uma brincadeira, para chocar o cara.

"Como é possível que alguém tenha levado aquilo a sério? Só um débil mental, um cara rancoroso e ressentido como o Benjamin, guardaria dessa forma dramática e embalada em rancor, durante 15 anos, uma piada, uma evidente brincadeira."
Balanço final:
  • a tentativa de estupro em 1980 não foi confirmada por ninguém, nem mesmo pela suposta vítima;
  • Lula parece haver feito em 1994 uma piada de mau gosto, como tantas outras que marcam sua trajetória de falastrão contumaz.
O certo é que não havia sustentação para a Folha publicar, p. ex., uma reportagem a este respeito. Não se lança uma acusação de tal gravidade contra um presidente a partir de tão pouco.

Concedeu, entretanto, uma página inteira para Benjamin colocar essa bobagem em circulação, municiando a propaganda direitista.

O flagrante desrespeito às boas práticas jornalísticas foi admitido pelo ombudsman Carlos Eduardo Lins da Silva, ao concordar com a observação de um leitor, segundo quem "não há outra opção ao jornal que publica artigo tão impactante quanto o de César Benjamin que a de, com suas equipes, tentar reconstituir os fatos narrados pelo autor".

Com a correção e a dignidade que o caracterizam, mas (perceptivelmente) sem poder dizer tudo que gostaria, o ombudsman fixou a posição correta:
"...é indispensável oferecer ao outro lado espaço e destaque similares para defender pontos de vista opostos aos do artigo de sexta-feira. O ideal seria a apuração factual dos eventos relatados e os argumentos contraditórios saírem com o artigo".
Sem motivo nenhum para ser comedido, afirmo: jornalisticamente, a atuação da Folha foi indefensável, desprezível, manipuladora.

Desceu aos esgotos, repetindo o episódio em que usou outro bobo útil de esquerda para tentar envolver a ministra Dilma Rousseff com um plano para sequestrar Delfim Netto que nunca saiu do papel (de quebra publicando, para denegri-la, uma ficha policial falsa que circulava na internet).

Ou seja, a fábrica de factóides da rua Barão de Limeira está especializando-se em manipular episódios obscuros para afixar etiquetas falaciosas em personagens políticos: Dilma Rousseff, sequestradora; Lula, estuprador.

Agora, a propaganda enganosa da direita vai martelar essas acusações mentirosas até que passem por verdade, como ensinava Goebbels.

Cesar Benjamin, que não é ingênuo, jamais deveria ter-se prestado a um papel desses.

Agora, ou ainda vem a público, com enorme atraso, comprovar sua acusação, ou estará definitivamente morto para a política.

Quanto à Folha, já morreu para o jornalismo faz tempo.

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