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terça-feira, 22 de setembro de 2009

INOCENTES ÚTEIS AJUDAM A DIREITA A SATANIZAR TOFFOLI



























Que a direita e seus porta-vozes tudo façam para impedir a aprovação de José Antonio Dias Toffoli como novo ministro do Supremo Tribunal Federal é compreensível.

Afinal, existe a possibilidade de que ele dê o voto decisivo para a confirmação do refúgio concedido pelo Governo brasileiro ao escritor italiano Cesare Battisti, frustrando a cruzada rancorosa que se tornou verdadeira obsessão para reacionários de dois continentes. Foi Gilmar Mendes o primeiro a alertar sobre esse perigo, açulando a mídia conservadora contra Toffoli.

Inaceitável é que defensores dos direitos humanos entrem como inocentes úteis na campanha da grande imprensa para satanizar Toffoli, conforme se constata na Folha de S. Paulo de hoje :
"'Depois da defesa que Toffoli fez de Ustra, notório torturador e assassino, só posso lamentar a indicação', disse Suzana Lisboa, da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos.

"'A indicação é incoerente com a política de direitos humanos do governo', afirmou a secretária municipal de Direitos Humanos de Recife, Maria do Amparo Araújo.

"O Grupo Tortura Nunca Mais-RJ, diferentemente da AGU, não considera que a Lei da Anistia proteja torturadores. 'A indicação de Toffoli é lamentável', disse a presidente da entidade, Cecília Coimbra.

"Dirigente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos-RS, Jair Krischke apontou como 'grave' a escolha de Lula, que será submetida ao Senado".
A DECISÃO FOI DO GOVERNO E NÃO DA AGU

É de uma ingenuidade atroz atribuírem à Advocacia Geral da União a responsabilidade por uma decisão que foi tomada por Lula e pela maioria de seus ministros, como esclareci várias vezes desde que a punição dos torturadores foi trazida ao debate político com o lançamento do livro Direito à Memória e à Verdade, em agosto/2007.

Eis, p. ex., como avaliei um dos pareceres da AGU no sentido de que a Lei da Anistia impede o julgamento dos torturadores, em outubro/2008:
"Se ainda havia alguma dúvida quanto à posição do Governo Lula diante da ditadura de 1964/85 e as atrocidades por ela cometidas, está dirimida: coloca-se mesmo ao lado dos totalitários.

"A União tinha três caminhos a escolher: entrar no processo ao lado dos procuradores [que moveram uma ação para obrigar os ex-comandantes do DOI-Codi/SP a ressarcirem os cofres públicos pelo que foi gasto com indenizações às vítimas deste centro de torturas], permanecer neutra ou tomar a defesa dos carrascos. Fez uma escolha inconcebível e inaceitável, até porque contradiz frontalmente toda a legislação internacional subscrita pelo Brasil e as recomendações da ONU. O Governo Lula nos tornou párias da civilização.

"Esta evolução dos acontecimentos, entretanto, está longe de ser inesperada, vindo ao encontro do que escrevi quando Genro e Vannuchi promoveram uma audiência pública para discutir a punição dos torturadores, no final de julho [2008].

"Lula, por meio de Jobim, desautorizou qualquer iniciativa do Executivo no sentido da revogação da Lei da Anistia.

"E as tentativas de contornar-se a Lei da Anistia, doravante, terão como adversária a União, que oficializou sua posição de endosso à impunidade dos carrascos."
No mesmo sentido, o sempre bem informado Kennedy Alencar assim explicou como as coisas se passaram nos bastidores do poder:
"A entrada de Nelson Jobim no Ministério da Defesa teve (...) o demérito de levar para o centro do poder uma figura que tem sido muito conservadora, exercendo uma influência nesse sentido sobre Lula e colegas de ministério.

"Jobim é da turma dos que acham que questionar se a Lei de Anistia (1979) perdoou crimes de tortura geraria uma crise militar. (...) No fundo, é uma reação corporativa e conservadora. Pena que essa visão tenha sido aceita na cúpula do governo por ministros que participaram da luta armada e que foram perseguidos pela ditadura.

"Lula assumiu uma posição vexatória, algo acovardada. A AGU acha que a Lei de Anistia perdoou os crimes de tortura. O presidente poderia mudar essa opinião - um parecer jurídico, mas também político. No entanto, o presidente preferiu fingir que não é com ele, deixando a decisão para o STF.

"O fato de a decisão caber à Justiça não significa que Lula não possa ter opinião. Seu governo, representado pela AGU, poderia e deveria defender uma posição mais progressista".
O certo é que a AGU emitiu pareceres no sentido de que a anistia de 1979 impede o julgamento dos torturadores, mas só o fez depois de a posição de Jobim ter prevalecido sobre a de Tarso Genro/Paulo Vannucci na disputa travada no seio do Ministério e de Lula haver se colocado inequivocamente ao lado da corrente majoritária.

Aliás, foi como ele agiu desde o primeiro instante. No momento mesmo do lançamento do Direito à Memória e à Verdade, o Alto Comando do Exército tomou as dores dos torturadores lançando, em 31/08/2007, uma nota oficial intimidatória que governo nenhum deveria aceitar, pois, como eu destaquei na época, colocou os fardados "acima dos três Poderes da Nação", configurando insubmissão e quebra de hierarquia . Lula, no entanto, não só engoliu o sapo, como ordenou a seus ministros que também deglutissem o batráquio.

Fica difícil sabermos quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha. Mas, é indiscutível que a AGU expressa fielmente a posição oficial do Governo, daí a incongruência em responsabilizar-se Toffoli no lugar daqueles que detêm o poder: Lula, Jobim e demais ministros reacionários.

ESQUERDA CONFUSA x DIREITA UNIDA

Enquanto a esquerda dispersa o foco e não dá a devida importância à principal batalha aqui atualmente travada entre libertários e autoritários, cujo desfecho poderá desencadear em acentuado retrocesso na defesa dos direitos humanos em escala nacional e internacional, a direita cerra fileiras ao lado de Berlusconi e Gilmar Mendes.

Conforme denunciei, a simultaneidade da publicação da notícia sobre os processos em curso no Amapá contra o escritório de advocacia de Toffoli se deveu a uma ação orquestrada envolvendo os principais jornais e revistas brasileiros.

A Veja, house organ da pior direita brasileira, faz militância ostensiva em favor da rejeição de Toffoli, seja por meio do blogueiro Reinaldo Azevedo, seja na edição escrita:
"De todos os ministros indicados por Lula para o Supremo, Toffoli é o que tem mais proximidade política e ideológica com o presidente e o partido. Sua carreira confunde-se com a trajetória de militante petista – essa simbiose é, ao fundo e ao cabo, a única justificativa para encaminhá-lo ao Supremo. (...) Toffoli pode vir a ser o terceiro ministro mais jovem da história do STF. Dependendo do que os senadores considerem como reputação ilibada, pode, também, ser o primeiro a viver o constrangimento de ter sua indicação rejeitada".
Da mesma forma, textos contrários à confirmação de Toffoli (e nenhum a favor) pipocam nos sites de extrema-direita como o Ternuma, A Verdade Sufocada, Mídia Sem Máscara e Resistência Democrática. Até uma petição on line para pressionar os senadores é encontrada nas tribunas das viúvas da ditadura.

Então, os libertários perspicazes põem a barba de molho. Caso do ex-ministro dos Direitos Humanos Nilmário Miranda, para quem "foi uma boa indicação"; e do atual, Paulo Vannuchi, ao afirmar que não divergirá da escolha do presidente.

Quanto aos desatentos, minha esperança é de que afinal lhes caia a ficha, talvez até lendo e ponderando sobre este artigo.

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