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quinta-feira, 23 de julho de 2009

Governo reduz taxa Selic, mas bancos não diminuem o ágio

O editorial de hoje da Folha de S. Paulo veio ao encontro de uma afirmação jocosa sobre o presidente Lula: a de que ele é o pai dos pobres e a mãe dos banqueiros.

Com seu eficiente serviço de pesquisas e acompanhamento dos indicadores da economia, o jornal permite-nos dimensionar bem a quantas anda o ágio bancário no Brasil.

Evidentemente, refere-se ao ágio pelo eufemismo de spread, definindo-o como "a diferença entre o que as instituições financeiras pagam aos depositantes pela captação de seus depósitos e as taxas que cobram em empréstimos".

Ora, desde os primórdios da humanidade aqueles que emprestam dinheiro com a condição de receberem de volta um valor maior são denominados agiotas.

Aliás, durante o feudalismo a Igreja Católica fazia sérias restrições à agiotagem. Depois, adequou-se ao espírito do tempo -- no caso, aos valores capitalistas.

Já que estou abrindo um parêntesis, aproveito para manifestar minha estranheza quanto a dois versos do "Pai Nosso" que, em algum momento das últimas décadas, foram alterados.

Quando aprendi a oração, em criança, pedia-se-Lhe que perdoasse "as nossas dívidas, assim como perdoamos aos nossos devedores". Era assim que se rezava e era assim que eu lia a oração nas cartilhas, livros, prospectos, etc.

Não me lembro o exato instante em que me dei conta de que se estava rezando de outro jeito: "perdoai as nossas ofensas, assim como perdoamos a quem nos tenha ofendido".

Afora a maneira antiga ter um certo viés anticapitalista (as dívidas que os outros têm conosco devem ser perdoadas, para que Deus perdoe as nossas, em sentido metafórico) e a atual inócua como placebo, a própria sonoridade piorou, a construção se tornou artificial; "nossos devedores" é muito mais direto e impactante do que "a quem nos tenha ofendido".

De uma coisa tenho certeza absoluta: se tudo que está na Bíblia realmente existe, o lugar dos banqueiros é no inferno, junto com os torturadores, traficantes e pedófilos.

Pois fazem o trabalho do diabo, tentando os homens para levá-los à perdição; arrancando até o último centavo dos pobres desesperados, independentemente do choro das crianças e do desamparo dos anciãos; exercendo um ofício que desperdiça esforços, desviando-os de finalidades socialmente úteis e nada de bom acrescentando à vida das pessoas, pois sua faina é tão parasitária como a de uma lombriga no corpo humano.

Parêntesis fechado, voltemos às informações do editorial da Folha:
  • o ágio bancário brasileiro, hoje em torno de 30 pontos percentuais, há anos vem sendo o mais alto do mundo(!);
  • é 11 vezes superior ao praticado nos países desenvolvidos;
  • é cinco vezes mais alto que o das nações em desenvolvimento.
Pisando em ovos, como é a postura habitual da imprensa quando alude aos grande agiotas, vulgo banqueiros, o editorial da Folha (ver aqui) aplaude a nova redução da taxa Selic, mas observa:
"O principal problema da política monetária nos últimos meses tem sido garantir que as quedas da taxa Selic se traduzam em reduções para os tomadores finais de empréstimos, de forma a criar um ambiente efetivamente favorável à retomada da atividade econômica."
Trocando em miúdos, o principal problema é que o governo está fazendo o que as grandes casas de agiotagem, vulgo bancos, sempre pediram: a redução dos juros básicos.

Mas, elas não fazem o que sempre prometeram que fariam: emprestar a mais gente e cobrar juros menores dos tomadores de empréstimos.

Há mais de um mês, no seu programa radiofônico semanal Café com o Presidente, Lula reclamava:
"...não basta taxa Selic cair. É importante que ela caia, mas é importante que o spread bancário diminua no Brasil. O spread ainda está muito alto, o spread ainda está seletivo..."
Então, só podemos concluir que a redução da taxa Selic, sem contrapartida dos sanguessugas, continuará servindo apenas para aumentar-lhes escandalosamente os lucros.

É o que eles vêm fazendo desde o ano passado, quando o Governo, tentando minorar os efeitos em nosso país da crise global do capitalismo, liberou R$ 100 milhões em depósito compulsório, começou a diminuir a Selic e reduziu os impostos sobre operações financeiras.

Como reagiram então os abutres? Aumentaram a oferta de crédito e o baratearam, para manter o nível da atividade econômica, evitando o agravamento da recessão?

Não, zelaram apenas pelos próprios interesses: preferiram engordar em quase 50% as provisões para créditos duvidosos, visando nada perderem durante a emergência nacional.

Depois de anunciarem, mês após mês, recordes obscenos de faturamento ao longo do Governo Lula, os usurários não abrem mão de um grama sequer da banha acumulada nos cinco anos e meio de vacas gordas.

Firme como geléia, o Governo Lula faz com que o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal ofereçam juros mais baixos do que o mercado em seus empréstimos, na vã esperança de que os bancos privados ajam da mesma forma.

Ou seja, acredita em disciplinar os vampiros pela via da concorrência, como está nos manuais capitalistas.

Finge ignorar que, na prática, a teoria é outra: aqui no Brasil, os bancos só amenizam suas práticas predatórias quando governos que não sejam sejam seus serviçais (nem bananas...) os forçam a isto.

Às boas, nunca se conseguiu concessão nenhuma dos nossos Shylocks, mais implacáveis ainda que o mercador de Veneza.

Daqui a alguns meses, o nosso bom Lula virá reclamar de que, "surpreendentemente", as medidas de boa vontade do Governo não produziram os resultados esperados.

Me engana que eu gosto.

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